Desde o final de outubro do ano passado até o último dia 5, a Polícia Federal (PF) de Caxias do Sul contabiliza 99 casos de imigrantes africanos que entraram no Brasil com passaporte falso. Os países de origem das pessoas que chegam à cidade da Serra Gaúcha são Gana e Senegal, mas eles apresentam documentos de outros países da África.
No caso do Senegal, os documentos são de diferentes países. Já os ganeses entram no país, basicamente, com passaportes da África do Sul, país em que os cidadãos não precisam de visto para ingressar no Brasil. Antes de chegar à Serra, a maioria dos ganeses passa pela cidade de Criciúma. O município catarinense tem sido o principal reduto da comunidade ganesa no sul do Brasil.
A melhor estrutura da delegacia da PF em Caxias e os órgãos de acolhimento aos imigrantes na cidade, principalmente ligados à Igreja Católica, atraem esses imigrantes para a cidade serrana. Em Caxias, eles encaminham o protocolo de refúgio, que permite fazer o CPF e a carteira de trabalho para arrumar emprego no país. Normalmente, após solicitar o protocolo, retornam para Criciúma.
Na Polícia Federal, os casos de passaportes falsos têm sido tratados de maneira administrativa. Em Criciúma, porém, três imigrantes ganeses foram presos em flagrante neste ano por apresentarem passaportes falsos. As três prisões aconteceram em abril deste ano.
O chefe da delegacia da PF de Criciúma, delegado Nelson Napp, afirma que se os imigrantes não tivessem apresentado os documentos falsos não teriam sido presos. Até o início da tarde desta quarta-feira um imigrante ganês continuava detido no Presídio Regional de Criciúma.
Em Caxias, o chefe da delegacia da PF, Noerci da Silva Melo, afirma que todos os imigrantes em que foi constatada a utilização de documento falso para entrar no Brasil, se apresentaram com o documento verdadeiro.
- Quem tem procurado Caxias, tem procurado para tentar regularizar a situação no Brasil. Eles se apresentam em Caxias com o nome verdadeiro e documentos verdadeiros. Depois, em diligências posteriores, seja através de entrevistas com eles ou na confrontação das digitais, se constata que determinados imigrantes ingressaram no Brasil com documentos falsos. A partir daí, apreendemos o documento falso. Essas pessoas são ouvidas e toda a documentação é enviada para o local onde eles ingressaram no país. Normalmente, eles ingressam via São Paulo - afirma Melo.
O roteiro Criciúma-Caxias do Sul se intensificou no ano passado durante a Copa do Mundo. Na época, cerca de 370 ganeses passaram por Caxias para solicitar o protocolo de refúgio. Os imigrantes da Copa entraram no Brasil com os passaportes ganeses e vistos válidos para o período da Copa do Mundo. Após conseguirem os documentos, a grande maioria dos imigrantes voltou para Santa Catarina. Grupos pequenos conseguiram emprego no Rio Grande do Sul e estão trabalhando há quase um ano em algumas empresas.
Falta de denúncias
O chefe da delegacia da PF em Criciúma acredita na existência de grupos de aliciadores, mas, segundo ele, a polícia ainda não conseguiu comprovar a existência de um esquema ilegal para trazer os imigrantes ganeses ao Brasil.
- Nós não temos ideia do motivo de a comunidade de ganeses aqui em Criciúma ser tão grande. Com certeza, é a propaganda. Deve haver pessoas que estão aliciando esses ganeses para residirem na nossa região. Não conseguimos constituir algum crime nessa entrada de imigrantes aqui (Criciúma). Não temos vítimas. Não há pessoas que nos procuram dizendo que foram enganadas com promessa de emprego. Não há notícias de prostituição, tráfico de drogas, que poderia configurar o tráfico de pessoas. Não temos elementos para indicar a prática de crime - afirma o delegado.
Em Caxias, o delegado Noerci da Silva Melo, também garante que ainda não foram registrados casos em que fosse evidente o tráfico de pessoas.
Criciúma
Criciúma vive hoje o fluxo contrário da imigração. Com a economia bastante ligada ao setor carbonífero, na década de 1990, moradores do município e de cidades vizinhas seguiram para os Estados Unidos para fugir da crise do setor.
Na semana passada, a reportagem da Gaúcha Serra esteve em Criciúma para acompanhar como vivem os imigrantes ganeses. No município de 200 mil habitantes, a comunidade ganesa é de cerca de mil pessoas. Eles têm chegado à cidade desde 2010, mas o pico da imigração foi no ano passado durante a Copa do Mundo no Brasil.
A parada de grande parte dos ganeses assim que chegam a Criciúma é a Casa de Passagem São José, no Bairro Pinheirinho, que é mantida pela prefeitura. São os funcionários da casa que acompanham a situação dos imigrantes na cidade. Até o início da tarde desta quarta-feira, das 25 vagas da casa, 20 eram ocupadas por imigrantes, a maioria deles ganeses. Os que não conseguem um lugar para morar, normalmente ficam em uma das cinco casas alugadas desde o ano passado com verbas do governo federal e administradas pela prefeitura.
As histórias dos imigrantes são todas muito parecidas. Eles saíram de Gana em busca de emprego para dar uma vida melhor aos familiares que ficaram. E a vontade expressada pela maioria é trazer a família para o Brasil. O motivo alegado para a escolha de Criciúma é sempre a oportunidade de emprego e negam qualquer tipo de pagamento a supostos coiotes. Nenhum afirma conhecer pessoas que organizam a entrada no país. O que se sabe é que os imigrantes ganeses têm chegado de avião, principalmente pelo aeroporto de Guarulhos, em São Paulo.
Os que chegaram durante a Copa do Mundo fazem questão de ressaltar o fato de terem entrado com documentos legítimos. Os que chegaram com documentação falsa, não contam como conseguiram o documento. Em diversos casos, os imigrantes afirmam terem destruído o passaporte falso logo após a entrada no Brasil.
Depois das três prisões em Criciúma, os imigrantes têm preferido solicitar o protocolo de refúgio na delegacia de Caxias.