Hábito comum do gaúcho no inverno, comer bergamotas sob o sol — o famoso "lagartear" — ficará prejudicado neste ano. É que a fruta cítrica foi fortemente impactada pelo excesso de chuva registrado em maio no Estado. O resultado é uma perda estimada em pelo menos 50% da safra prevista para a Serra. O levantamento é do escritório da Emater Regional, localizado em Caxias do Sul, que atende a 50 municípios da região.
Em uma safra considerada normal, cheia, são colhidas em torno de 16,3 mil toneladas de bergamota na Serra, com destaque para municípios como Cotiporã, Veranópolis, Antônio Prado e Caxias do Sul, de acordo com o engenheiro agrônomo da Emater Regional Enio Ângelo Todeschini. Para este ano, portanto, em um cenário que ainda pode mudar, os produtores devem colher cerca de 8 mil toneladas da fruta. A safra começa em março e as variedades mais tardias podem ser retiradas do pé até outubro. Ao todo, são 1.150 hectares com bergamoteiras nas 50 cidades atendidas pelo escritório regional.
O acumulado de chuva fora do comum, a elevação na umidade do ar e a falta de radiação solar (importante para garantir a absorção de nutrientes) provocaram o apodrecimento das frutas, a queda antecipada do pé e rachaduras nas cascas das bergamotas — a estrutura externa não acompanha o crescimento da polpa, inchada pelo excesso de água, e racha.
— Nós tivemos dois impactos: primeiro, as variedades mais precoces, no final do crescimento ou já em maturação, tiveram uma queda muito grande do pé. As tardias, principalmente a montenegrina, a principal variedade cultivada na Serra, há pomares inteiros em que os agricultores não vão colher praticamente nada porque as frutas estão rachando — ressalta Todeschini.
Outro problema constatado pela Emater é a dificuldade de acesso às bergamoteiras diante de queda de barreiras em estradas e dentro das próprias propriedades rurais.
Em Caxias do Sul, conforme o engenheiro agrônomo e extensionista rural da Emater municipal, Mauro Tessari, a perda deve girar em cerca de 20% na produção da fruta. O município contabiliza 150 hectares com pés de bergamota e 135 produtores.
Quem sofre com as consequências da chuvarada no município é o produtor caxiense Josué Perini. Ele e a família mantêm quatro hectares de bergamota em uma propriedade em Loreto da Segunda Légua. Para este ano, a perda é estimada em 20% até o momento. A variedade montenegrina, mais tardia, será colhida entre setembro e outubro.
Nos pés, as frutas ainda estão verdes, na etapa de enchimento, com cerca de 60% do ciclo completo. Mesmo assim, já é possível observar os impactos do excesso de água: há bergamotas apodrecidas no chão e algumas com a casca rachada. Em uma safra normal, a família Perini colhe, geralmente, 100 toneladas da fruta, que têm como destino Porto Alegre e o Espírito Santo.
Outro prejuízo, segundo Perini, é a dificuldade de acesso de tratores às bergamoteiras para aplicação dos defensivos agrícolas, que ajudam a afastar doenças. Trabalhando há 16 anos com os cítricos, ele diz que, apesar das perdas na produção e consequentemente também financeira, é preciso agradecer por todos os familiares estarem com saúde e a moradia da família estar intacta.
— Nem vamos reclamar, porque não ficamos alagados e não perdemos ninguém da família. É ruim perder estes 20%, mas isso não irá nos afetar tanto quanto quem teve que sair de casa — avalia.
Próximo da propriedade dos Perini, Rineo Luiz Dalla Rosa também estima prejuízo igual ao do vizinho, de 20%, na colheita da bergamota. O agricultor conta que são três hectares em produção e outros dois com pés em formação, cuja colheita deve se iniciar a partir do ano que vem. As variedades cultivadas são caí (que são retiradas do pé há cerca de um mês), montenegrina e ponkan.
— Ano passado, fizemos 21 toneladas de fruta — detalha.
Frutas menos saborosas para os consumidores
As condições climáticas não prejudicam somente os produtores. Quem compra a bergamota no mercado, poderá encontrar frutas menos saborosas e com cores menos vibrantes em função da chuva. O engenheiro agrônomo da Emater Regional Enio Ângelo Todeschini explica o porquê:
— Para transformar os ácidos em açúcares, precisa-se de insolação, da fotossíntese. Outro fator importante são as baixas temperaturas à noite, que fazem concentrar os açúcares, deixando a fruta menos aguada e mais saborosa — pontua.