Um texto, de autoria atribuída a mais de um autor, afirma que cada pessoa, em sua existência, pode ter duas atitudes: construir ou plantar. Diz a mensagem que os construtores podem demorar anos em suas tarefas, mas um dia terminam aquilo que estavam fazendo. Os que plantam sofrem, às vezes, com as tempestades e as estações e raramente descansam. Mas, ao contrário de um edifício, o jardim jamais para de crescer.
Euclides Antonio Sirena parece ter optado, claramente, pelo plantio. Ao longo dos 71 anos de vida, cultiva não apenas flores e plantas, uma de suas tarefas preferidas, mas solidariedade.
— Tudo o que ele planta, cresce — diz a esposa Angelina Arlete Schio Sirena, 71.
Embora a frase se refira à mão boa com a terra, aplica-se facilmente à postura de Sirena no dia a dia. Tem a mão dele projetos consagrados em Caxias do Sul, como o Banco de Alimentos e Banco do Vestuário.
— Ele não pensa nele, pensa nos outros. É todo solidário, quer ajudar. Eu gosto de ver essa parte dele. Faz tudo o que pode e não mede esforços — orgulha-se Angelina.
Abraçar muitas causas e ajudar a comunidade faz parte do perfil do empresário desde muito cedo. Ainda criança, precisou assumir responsabilidades em casa e amadureceu rápido. Mais velho de sete irmãos, tornou-se o braço direito dos pais.
— Ele tinha quatro anos e já ajudava a cuidar dos irmãos — lembra a mãe, Ivany Finimundi Sirena, 90, mais conhecida como Ivone.
— Foi uma vida de muita necessidade. A mãe estava sempre doente. Ele não quer que os outros passem a dificuldade que ele passou — completa a irmã Neusa Maria Sirena Vergani, 65.
O trabalho social é tão intenso que já rendeu muito reconhecimento e homenagens, como a comenda Percy Vargas de Abreu e Lima, em 2014, medalha concedida pela Câmara de Vereadores de Caxias do Sul a quem atua em prol dos direitos humanos. Mas a maior alegria é ver as sementes plantadas dando frutos. Por isso, talvez, o Projeto Pescar seja uma das iniciativas que mais lhe dá orgulho. As fotos de inúmeras turmas de jovens em vulnerabilidade social formados pelo projeto decoram uma das salas da empresa que mantém com os filhos no bairro São Victor.
— Muitos deles eu encontro ainda hoje e estão trabalhando — conta Sirena, com sentimento de dever cumprido.
Curioso e criativo
Natural de Caxias, Euclides Sirena se criou no São Victor quando o bairro ainda era considerado colônia. Trabalhava na roça com a família, mas, aos 18 anos, precisou procurar emprego formal para ajudar no sustento da família. Conseguiu na Marcopolo, onde permaneceu por 10 anos e fez um pouco de tudo: auxiliar de soldador, trabalhou no setor de protótipos, na estofaria, no almoxarifado, foi montador, cronometrista e fez controle de qualidade:
Tudo o que ele planta, cresce
ANGELINA ARLETE SCHIO SIRENA
Esposa
— Eu só sabia virar terra, plantar tomate e tirar leite. Mas não podia perder o emprego, eu tremia. Quando recebia, entregava todo o salário.
Depois da Marcopolo, foi para a Dambroz. Também trabalhou como costureiro com o sogro e na antiga Réquiem Fábrica de Urnas até decidir empreender. Partiu para o ramo da gastronomia, mostrando ser muito versátil. Foi sócio do restaurante Sica por 39 anos.
— Ele gosta de botar a mão em tudo. É muito curioso e criativo — diz o irmão Nelson José Sirena, 64.
A mãe confirma o espírito criativo e empreendedor desde criança. Ela lembra que Sirena criava passarinhos, coelhos e porquinhos da Índia para vender e ganhar um dinheiro extra. E gostava de invenções.
— Ele tem cabeça de engenheiro. Tinha 12 anos e inventou uma máquina para cortar mandioca — conta dona Ivany.
Sempre perto da família
Para Euclides Sirena, estar perto da família é uma das coisas mais importantes da vida. Por isso, fez questão de ter a mãe, os irmãos e os filhos morando perto. Continua no bairro São Victor, hoje totalmente urbanizado, bem diferente de quando era criança.
A Siplás, empresa da família, fica na mesma propriedade, na Avenida Maurício Sirotsky Sobrinho. Perto de casa, consegue dar escapadinhas para ver a mãe e recebe a visita da neta Mariana, de oito anos.
— A gente chama a Mariana de carrapato (risos). Está sempre grudada no avô e no pai (Gustavo). Ela inventa história para puxar conversa com ele — conta Angelina.
Os almoços aos domingos são sagrados. Gosta de reunir todo mundo e, nas férias, os encontros são na praia de Areias Brancas, onde os irmãos também têm casa. Feijoada e churrasco não podem faltar para confraternizar.
— Ele gosta de baralho e jogar conversa fora — diz a irmã Ivete Sirena Mapelli, 68, sócia de Sirena no Sica durante muitos anos.
— Quando eles estão reunidos, é a coisa mais bonita de se ver. Brincam, contam piada. Eu vivo feliz em ver todos juntos — emociona-se a mãe.
Pai e marido exemplar
Ir ao Clube Rodoviário era um dos lazeres do jovem Sirena aos domingos. Foi numa dessas idas que conheceu Angelina. Deu sorte, porque ela costumava ir ao Roda Viva e, justamente naquele dia, mudou a rota, porque o clube preferido estava fechado.
— Ele era bem romântico e gostava de enviar cartões. Mas eu estava meio assim. Minha mãe disse: "Olha, ele é um bom rapaz" – recorda Angelina.
Eu só sabia virar terra, plantar tomate e tirar leite. Mas não podia perder o emprego
EUCLIDES SIRENA
Empresário
Mais velha de sete irmãos assim como Sirena, Angelina foi percebendo mais semelhanças com o passar do tempo. Já são 46 anos de um casamento que trouxe dois filhos: Gustavo, 41, e Guilherme, 37; e dois netos: Mariana, oito, e Augusto, 13, filhos de Gustavo.
— Trabalhamos muito e conseguimos realizar muita coisa. Começamos do zero. E se ele fazia algo (voluntariado), é porque sabia que eu estava cuidando da empresa e da família — reflete a esposa.
Para os filhos, Sirena é um exemplo de pai com personalidade forte e dedicado ao trabalho, além de incentivador.
— É empreendedor e para ele não tem tempo ruim — destaca Guilherme.
— Ele fica um pouco desconfortável em ver algumas situações e sempre nos mostrou o que é preciso fazer para ajudar e minimizar o sofrimento das pessoas — acrescenta Gustavo.
Um homem de fé
Alguns rituais são importantes para Sirena. Ler o Evangelho antes de sair de casa para o trabalho é um deles. As palavras o orientam e ajudam a encarar os desafios. O hábito é herança da família religiosa e a fé o ajudou a encarar momentos difíceis, como a crise no restaurante nos anos 2000, quando precisou demitir funcionários e usava o carro emprestado da irmã.
— Eu administrei tão mal que deveria ter sido preso naquela época. Ninguém me julgou, mas eu me julguei, me puni — amargura-se ao lembrar.
Apesar daquele período difícil, Sirena tem motivos para se orgulhar. Conseguiu dar a volta por cima e segue empreendendo com olhar empático para as pessoas. Na empresa atual, por exemplo, prefere manter empregados que poderiam ser substituídos por máquinas.
— Ele é um paizão, preocupado com todos. Se acha no dever de proteger a todos — diz o irmão Nelson.
— Era meu sócio na empresa. Ele não era patrão, era colega. Agia mais com o coração do que com a razão — conta a irmã Ivete.
"Eu planto. Depois, alguém colhe"
Os depoimentos de quem convive com Sirena e as ações do empresário mostram que ele já semeou muito. Não só no jardim de casa, mas na família e na comunidade. Como empresário, contribuiu para a economia, gerando emprego e renda.
Foi presidente da Associação de Dirigentes Cristãos (ADCE) e da Fundação Caxias e criou importantes projetos para a cidade, como os bancos de Alimento e do Vestuário e o Projeto Pescar. Na época da ADCE, trabalhou, inclusive, para a criação da disciplina de Empreendedorismo Cristão na UCS. Também presidiu a Patna, a Pastoral de Apoio ao Toxicômano Nova Aurora.
— Ele sempre diz: "Eu planto. Depois, alguém colhe". Coloca uma flor e cresce bonita. Cresce como ele, porque ele é uma flor — orgulha-se a mãe Ivany, numa analogia que vale tanto para o cuidado com a terra quanto para a vida humana.