Pelo sétimo ano seguido a Finlândia, na região Norte da Europa, recebeu o título de "país mais feliz do mundo" pelo levantamento World Happiness Report, realizado pela Rede de Soluções para o Desenvolvimento Sustentável da Organização das Nações Unidas (ONU). O documento foi divulgado em março e se baseia na avaliação que as pessoas fazem da própria felicidade levando em conta dados econômicos e sociais do país onde vivem, considerando seis fatores-chave: apoio social, renda, saúde, liberdade, generosidade e ausência de corrupção.
A Finlândia é um país nórdico com mais de 5,5 milhões de habitantes. A grande maioria dessas pessoas mora na parte Sul do país, principalmente pra escapar do frio de outras regiões. Os idiomas oficiais são o finlandês e o sueco, só que boa parte da população fala o inglês.
Segundo o Itamaraty, cerca de 2,3 mil brasileiros vivem por lá. Entre eles está o casal caxiense Henrique de Aguiar, 39 anos, e Taís Griguol, 38. Eles se mudaram em agosto de 2018 após Aguiar ter recebido uma proposta de emprego em uma empresa do setor de tecnologia. Naquele momento ele também tinha a oportunidade de morar na Dinamarca ou Portugal, mas escolheu a Finlândia por ser uma condição mais atrativa. Mas essa não foi a primeira experiência do casal fora do Brasil. De setembro de 2017 a abril de 2018 eles moraram em Toronto, no Canadá.
— Queríamos sair do Brasil e eu acabei fazendo entrevistas porque o setor de TI é muito mais fácil de conseguir algo e, digamos assim, tem um suporte para morar para fora do país. Eu recebi algumas propostas, e aqui foi a mais interessante. A gente não procurou a Finlândia em si, foi uma oportunidade de emprego que nos trouxe para cá — explica Aguiar.
Maior sensação de segurança
A cidade onde vivem é Helsinki, capital do país, que tem aproximadamente 630 mil habitantes. Além da busca por novas vivências profissionais, a segurança pesou na escolha:
— Viemos sem saber muita coisa e quando chegamos aqui ficamos apaixonados de cara. Com o passar do tempo fomos colocando o pezinho no chão, têm problemas como em todo lugar, mas a qualidade de vida, a paz que tem aqui... Eu posso sair na rua de madrugada com equipamento fotográfico sem me preocupar — descreve Taís, que é fotógrafa.
O casal brinca que os finlandeses até acham engraçada a pesquisa, e dizem "não ser melhores do que os moradores de outros países". Na opinião de Taís não significa que a Finlândia seja perfeita, mas ela percebe que o país se preocupa com a qualidade de vida das pessoas. Outra constatação do casal é com relação à desigualdade social, que eles julgam ser menor do que em outros países.
— Não é que a Finlândia seja um país sem problemas. Existem problemas de alcoolismo, preconceito com imigrantes, é difícil entrar no mercado de trabalho. Tem problemas como outros países, mas em contrapartida, te dá segurança, saúde pública, serviço social, educação e transporte de qualidade — pontua Taís.
E o frio da Finlândia?
Nesses quase seis anos em que estão na Finlândia, o dia mais frio que Henrique e Taís enfrentaram marcou -23ºC nos termômetros, com sensação térmica de -30ºC.
— O que eu gosto de dizer é que no Brasil a gente passa frio e aqui faz frio. Como aqui todas as casas tem calefação, normalmente ficamos de bermuda e camiseta em casa, mesmo no inverno, porque está 22ºC dentro de casa — explica Aguiar.
E a Taís ainda comemorou uma diferença do inverno: na Finlândia é seco, longe de toda a umidade percebida aqui Serra gaúcha. A rinite dela desapareceu nesse período, assim como a sinusite dele, confirma o casal.
Equilíbrio entre trabalho e lazer
O casal Henrique de Aguiar e Taís Griguol sente que a vida corre diferente na Finlândia. A rotina de trabalho se assemelha por ter cerca de 8h diárias, mas os finlandeses prezam pelos momentos de descanso, separando bem a rotina agitada do dia a dia. Henrique brincou que no primeiro ano de empresa o chefe chegou a lhe dar uma bronca por ter feito hora extra.
— Eles levam o trabalho muito a sério, e da mesma forma o lazer. O equilíbrio é muito importante. Quando chega o horário de ir embora, eles vão. Aquela cultura de hora extra não tem, e tu acabas tendo mais tempo para ti — avalia Taís.
Até para aproveitar melhor esse tempo, há dois anos o casal adotou a Amora, uma cachorrinha da raça samoieda, típica de países mais frios.
— São no mínimo uns 10 quilômetros por dia caminhando com ela. A Amora é bem ativa. E, um dos objetivos de pegarmos uma cachorra dessa raça foi nos mantermos ativos, fazendo mais atividades físicas e aproveitando a natureza daqui, que é abundante. E, nos fim das contas ela é alguém da família — conta a fotógrafa.
Na visão deles, a Finlândia tem um dos custos de vida mais caros da Europa. No entanto, não consideram isso um fator negativo, o casal brinca que lá é mais tranquilo para fazer o dinheiro render do que quando moravam em Caxias.
Os desafios de um fotógrafo caxiense
O fotógrafo Gustavo Juber, 34, é outro caxiense que fixou residência na Finlândia. Ele está por lá há cerca de seis anos, onde atualmente mora em Tampare, cidade conhecida pelas saunas, com aproximadamente 230 mil habitantes. Juber brinca que não escolheu a Finlândia como um destino para viver. Ele descreve assim o que lhe mantém no país:
— Foi a possibilidade de poder correr atrás das coisas em que acredito. Muito da política finlandesa se reflete em coisas que eu acredito, como o desenvolvimento sustentável, a economia circular, a educação de qualidade para todos, entre outros.
Juber conta que os primeiros anos morando na Finlândia foram complicados financeiramente e lembra da dificuldade para encontrar um bom emprego. Após mais de um ano vivendo por lá, ingressou na Universidade de Tampere, porque era a única que não exigia exame de língua inglesa para a admissão. Atualmente, se diz realizado porque trabalha na sua área, a fotografia.
— Atuo com artistas e bandas locais que querem produzir imagens ou vídeos para algo específico, como um álbum, lançamento ou até mesmo portfólio. Também atuo como cinematografo para artistas locais. Como artista local também produzo bastante coisa, minha tese é sobre o consumo de areia em escala global. Após a universidade pretendo continuar trabalhando como um artista multidisciplinar que tem a fotografia como aliada.
Inclusive, até o dia 4 de abril, ao lado de outros 13 artistas que também estão se formando na universidade, o caxiense expõe sua visão de mundo em seis trabalhos, sendo quatro fotografias, uma instalação com areia e um vídeo.
Fora da rotina de trabalho, ele também busca aproveitar a vida na Finlândia. Nos finais de semana sai com os amigos para ir em algum bar que tenha cerveja barata, porque segundo ele, lá é bem cara a bebida. A cerveja é vendida, em média entre 6 e 8 euros. Ele descreve o finlandês como "gente boa", mas lembra que já passou alguns problemas, principalmente, no que se refere ao preconceito por ser estrangeiro.
— 90% dos meus amigos são estrangeiros. Pouquíssimos amigos são finlandeses, dos quais eu consegui manter contato nesses quase seis anos de estadia. Finlandeses têm uma capa bem dura de ser quebrada para além dos grupos de trabalho ou universidade — aponta Juber.
De Caxias, o fotógrafo diz ter saudades de compartilhar do bom chimarrão e dos amigos.
Desejo por fixar residência
O que levou o caxiense Lucas Matzenbacher Della Porta, 27, a mudar-se para a Finlândia foi a possibilidade de fazer um estágio na área de radiologia, radioterapia e medicina nuclear, uma exigência da Universidade do Algarve, de Portugal, onde estava matriculado. Naquele momento ele pôde escolher entre estagiar no país ibérico ou em outro de sua escolha.
— Eu tinha algumas opções, mas eu sempre tive um interesse pelos países nórdicos, a Noruega, a Suécia e a Finlândia. E aí um dos hospitais que precisava de estagiário e que poderia me receber era na Finlândia. Sem pensar duas vezes, eu resolvi ir. É um país de primeiro mundo, boa educação, saúde e tudo mais — relembra ele sobre o estágio que durou de janeiro a abril de 2023, na cidade de Vaasa, com 66 mil habitantes.
O caxiense descreve o período na Finlândia como positivo. Ele lembra que era tranquilo encaixar as rotinas de estágio e estudos com o tempo de lazer. Algo que o encantou no país foi a possibilidade de ter um contato maior com a natureza, o que lhe possibilitou algumas viagens, principalmente para ver a aurora boreal.
— Eu gosto de cidades pequenas e gosto de natureza. Gosto de me comunicar com a natureza, estar toda hora em contato com isso. E na Finlândia tu tens muito isso, muito espaço aberto, muita floresta, muita natureza, vida selvagem, tanto no verão como no inverno.
Após a primeira passagem de três meses, ele voltou ao país entre janeiro e março desse ano, e nessa vez ficou em Karjaa.
O caxiense descreve os finlandeses como pessoas simpáticas, e acredita que a proximidade com a natureza, além é claro, dos fatores econômicos, auxiliam a estabelecer o país como o "mais feliz do mundo". Ele pretende voltar à Finlândia em outubro desse ano para fixar residência na cidade de Rovaniemi, onde inicialmente deve trabalhar como guia turístico de aurora boreal e, depois, pretende voltar à área de formação na radiologia, radioterapia e medicina nuclear.
— Às vezes bate aquela saudade de casa. É normal, principalmente quando a gente tem uma família boa. Mas é o meu caminho, são as coisas que gosto de fazer, gosto sempre de procurar coisas que me causam desconforto, e acho conforto nisso — brinca Lucas.
Curiosidades sobre a Finlândia
- Turku é a cidade mais antiga do país e a primeira capital.
- Em 2010, a Finlândia decretou o acesso à banda larga com conexão de, no mínimo, 1 Mb/s como um direito básico de seus cidadãos.
- O governo finlandês é quem controla a importação e venda no atacado das bebidas alcoólicas no país. Por isso, nem todo restaurante ou supermercado pode comercializar.
- Finlandeses têm um hábito um pouco incomum: o "kalsarikännit", que significa ficar em casa, bebendo e vestindo apenas roupas de baixo.
- A carne de rena é uma iguaria exótica apreciada pelos finlandeses, mas de preço mais caro.
- Os finlandeses são a população com o maior consumo de café per capita em todo o mundo, o que faz desse o principal produto de exportação brasileiro para lá.
- O escritor J. R. R. Tolkien se inspirou no finlandês ao criar o quenya, um dos idiomas élficos do universo de O Senhor dos Anéis.
- Palavra de origem finlandesa, a sauna foi criada no país. A prática é uma tradição, semelhante às churrasqueiras no Rio Grande do Sul, e poucas são as residências que não possuem uma sauna.
- A Finlândia nunca disputou uma Copa do Mundo de futebol. O esporte preferido pela população é o hóquei.
- O país possui apenas 18 habitantes por quilômetro quadrado, a menor densidade populacional de toda a Europa.
- Segundo o Itamaraty, são estimados 2,3 mil brasileiros vivendo no país.