Natália Borges Polesso passou a tarde de sexta-feira dando refresh na tela do site Câmara Brasileira do Livro. Quando, enfim, saiu a lista dos indicados para o 58º Prêmio Jabuti, o mais tradicional da literatura brasileira, ela gritava por vários minutos: “Não pode ser, não pode ser”.
Para que aquela informação fosse palpável, pediu que a namorada Daniela imprimisse a página onde estavam escritos os indicados ao prêmio na categoria Contos e Crônicas: Natália Borges Polesso, pelo livro Amora.
– A gente se inscreve para um prêmio e tenta esquecer. Mas os amigos ficam perguntando, aí começa a dar um nervoso. Ainda é difícil falar, pois estou assimilando. Mas a sensação é de que estou fazendo a coisa certa. Que bom que eu escrevo. É para isso que eu também faço traduções e dou aulas – disse ela, ontem, na hora do almoço, entre garfadas de massa ao pesto e um suco de limão “para passar a ressaca”.
Sim, a festa deve ser prévia. E merece ser feita. Afinal, só a indicação já é um prêmio.
– É gratificante, pois é um reconhecimento de especialistas em nível nacional. O bacana também foi receber feedbacks de meninas felizes por se identificarem com o livro.
Amora é amor no feminino. É um atravessamento de personagens, situações e sensações sobre mulheres que amam mulheres. A tiragem foi de mil exemplares, mais da metade foi vendida. A editora é a Não Editora. Pequena, mas combativa. Por isso, a indicação entre nomes como Luis Fernando Verissimo, Rubem Fonseca, Antonio Carlos Viana é outro fato a festejar.
Viril e delicado, íntimo, confessional e ativista, Amora é o terceiro livro de Natália e vem demarcando espaço no mundo das letras. Lançado em outubro de 2015, no ano passado venceu o Prêmio Ages – Livro do ano na categoria contos e ganhou resenhas elogiosas no site Nonada, teve um trabalho sobre ele na UFRGS e vem sido lido de Porto Alegre a Vitória, João Pessoa e São Paulo, onde, aliás, ficou por várias semanas entre os destaques das livrarias Cultura.
A indicação ao Jabuti também o faz concorrente do prêmio da Amazon – a votação é popular e, até ontem, ela estava “cabeçaXcabeça” com Veríssimo.
– Amora é um livro com histórias de mulheres lésbicas. Pode ser para todos, mas é importante marcar que essas mulheres estão aí. Tem uma questão crescente na literatura com livros sobre minorias na literatura, sobre periferias, negros e também com personagens gays. Isso já existiu em Caio Fernando Abre, Lygia Fagundes Telles. Meus temas são uma escolha consciente. Quero escrever sobre coisas importantes para mim. Recortes para Álbum de Fotografia sem Gente e Coração à Corda já tinham estas questões. As mulheres vêm tendo mais espaço, começam a aparecer mais porque a gente está se lendo e quando isso aparece, o Amora aparece – diz a escritora.
Ao mesmo tempo em que festeja a indicação ao prêmio, Natália finaliza sua tese de doutorado na PUC. Escreve sobre literatura e cidade, mapeando locais que são referência em livros. Tem um livro escrito para a Belas-Letras para uma série que fala sobre música e literatura – uma história sobre uma menina epilética que ouve New Order de Ian Curtis – e planeja um romance “meio distópico”. Destoando das convenções, eis Natália Borges Polesso afirmando singularidade e autoria na literatura brasileira. O resultado sai em 11 de novembro.
Então, força para o Amora “na” Jabuti!