Pode haver vitória na derrota? Talvez sim. Por exemplo: na órbita do futebol, alguns perdedores costumam proclamar que "a derrota foi honrosa". De passagem: na Copa do Mundo de 1978, o treinador brasileiro Cláudio Coutinho cunhou, como consolação, a famoso termo de “campeão moral”, referindo-se ao vergonhoso suborno da Ditadura argentina para "persuadir" os peruanos a tomarem uma goleada homérica e, assim, propiciar a larga vantagem de gols que Vidella e seus asseclas precisavam para avançar na competição. Mutatis mutandis, mal comparando, com os Farrapos aconteceu coisa similar: lutaram por seus ideais enquanto puderam e tiveram forças.
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E não por pouco tempo: consumiram suas resistências em nada menos do que dez anos – o marcante "Decênio de Graça e Honra". Deram eles uma modelar demonstração de destemor e de firmeza. Sem o menor medo protagonizaram feitos assombrosos mesmo com um exército dotado de débil capacidade bélica para enfrentar a fúria da Guarda Imperial. Em sua bravura e simplicidade, com uniformes escassos e esfarrapados, os gaúchos reproduziram os revoltosos franceses "sans-coulotte", catapultados pelo seu sangue e sua alma, tendo a audácia , o caráter e a coragem como suas armas vitais. A gente sabe como tudo terminou: apesar da gigantesca dimensão de esforços e dos mais árduos sacrifícios, a inssurreição acabou sufocada.
Quase 50 mil combatentes tombaram mortalmente feridos nas mais encarniçadas batalhas. Eles, os relegados, que nunca chegaram a fazer parte das Capitanias Hereditárias, muito mais ligados às fronteiras hispânicas por estilos, usos e costumes. Um povo que ficou alijado, ignorado e esquecido pelo resto do Brasil. Homens de fibra e personalidade, eles sabiam que eram rebeldes com causa. E que causa! Além do mais, abolicionistas por crenças e convicções sonhavam com o término da escravidão, com alto espírito humanitário. Tão grandiosos que Garibaldi, depois envolvido nas escaramuças pela Unificação italiana, discursava para os soldados compatriotas: "eu os convoco à maneira dos gaúchos, não lhes oferecendo pagamento, comida ou medalhas, mas, sim, fome, sede, marchas forçadas e até mesmo a própria morte".
Por isso, quando ele vislumbrou Anita, fulminado por um amor à primeira vista e ardendo de paixões, decretou contundente: "Tu serás minha!" E, romanticamente flechado, derreteu-se num fraseado poético: “tu hás de ser o meu tesouro proibido e de tua valentia eu irei extrair o montante de energia que ainda desejo e preciso ter”. Grande Giuseppe! Magnífica Anita! Eles, os Heróis dos Dois Mundos juntos com os destemidos farroupilhas nos legaram a herança da vergonha da cara, da sensação de liberdade e de um separatismo que teria enchido os nossos corações de fervor patriótico. Existem, sim, vitórias nas derrotas. Daí, que me desculpem os demais, mas 20 de setembro é o autêntico Dia da Pátria Gaúcha!