Tarefa no passado restrita aos institutos meteorológicos, o acompanhamento das mudanças do clima já encontra espaço entre quem depende das alterações no tempo para realizar seu trabalho. Na agricultura, por exemplo, as estações particulares são cada vez mais comuns e vistas como opções mais eficazes para áreas geográficas específicas. Por outro lado, aficcionados por fenômenos climáticos também recorrem aos equipamentos apenas como hobby.
Localizada em Pinto Bandeira, município vizinho a Bento Gonçalves, a vinícola Cave Geisse possui um sistema próprio para prevenir a destruição dos vinhedos em razão de geadas. Sensores espalhados entre as plantas identificam a chance da formação de congelamento do orvalho, dando tempo aos produtores tomarem medidas para salvar os parreirais.
- Nos últimos 12 anos, usamos esse sistema todos os anos. Quando criam-se as condições para uma geada forte, um alarme soa, e os empregados entram em ação. Normalmente, ocorre entre 2h e 3h da madrugada - conta o enólogo Daniel Geisse.
Assim que a sirene é acionada, os funcionários passam por entre os 23 hectares de vinhedos com um trator no qual é acoplado um dispositivo que lança jatos de ar quente a 140ºC, criando uma camada de inversão térmica, impedindo que as plantas congelem.
- Com isso, conseguimos aumentar a temperatura das plantas em 8ºC e não as perdemos. Mas isso só é possível em geadas convencionais, quando não há vento e o gelo começa a se formar de baixo para cima. Quando tem vento e a geada vem de cima, é muito difícil de conseguir fazer alguma coisa, como no ano passado - explica Geisse.
Guardiã do tempo
Neusa Maria Salvador Machado, 56 anos, é uma espécie de guardiã do tempo em Caxias do Sul. Desde 1979, ela mantém a mesma rotina na função que exerce no escritório do 8º Distrito de Meteorologia (8º Disme), no último andar do Aeroporto Regional Hugo Cantergiani. Sua tarefa é preciosa: coletar os dados da estação instalada próximo à pista do aeroporto e informá-los à sede do Disme, em Porto Alegre, onde meteorologistas utilizarão os dados para elaborar as previsões.
- Fui a primeira mulher a trabalhar na estação meteorológica de Caxias. Vim e me apaixonei - conta.
Dia sim, dia não, faça chuva ou faça sol, Neusa executa os mesmos passos. Há 37 anos. Às 8h30min, às 14h40min e às 20h30min, a observadora meteorológica desce até a cabeceira da pista e anota os dados registrados em cinco equipamentos e retorna ao escritório para anotá-los em planilhas e repassá-los por telefone à equipe na Capital. Em cada ida a campo, verifica itens como temperaturas mínima e máxima, volume de chuvas, quantidade de sol, pressão atmosférica e nebulosidade. Os dias de trabalho ela intercala com outra colega, no escritório desde 2013:
- Essa rotina já faz parte da minha vida. Até mesmo nos dias de folga eu acordo no mesmo horário, como se eu tivesse que fazer as medições.
Neusa começou a trabalhar na estação aos 18 anos. Foi logo depois de concluir o ensino médio. Zelador do Hugo Cantergiani durante 40 anos, foi o pai dela, Pedro Paulo Salvador, quem a indicou para a vaga, aberta com a mudança da estação para o terreno do aeroporto. Inaugurada em 1912 na região central da cidade, o escritório também já funcionou junto ao 3º Grupo de Artilharia Antiaérea, no bairro Rio Branco.Aos 56 anos, fala orgulhosa de seu trabalho:
- Muitos agricultores utilizam as informações, bem como quem trabalha na construção civil, que solicita dados como médias de vento para determinar a posição dos prédios. O Samae também pede bastante, quando há estiagem.
Há quase quatro décadas na profissão, Neusa diz preferir o frio ao calor. Para ela, as baixas temperaturas favorecem a aproximação das pessoas.
- No frio, a gente come melhor, dorme melhor, as pessoas se agrupam. É mais aconchegante - afirma.
Ironia ou não, ela não costuma acompanhar a previsão do tempo nos meios de comunicação.
- Não lembro de ficar assistindo a uma previsão do tempo. Os colegas e a família até perguntam quando chego: "Neusa, vai chover hoje?". Já virou hábito, mesmo eu não sendo meteorologista - brinca.
Primeira estação foi comprada na Alemanha
A chegada do inverno é um prato cheio para Eduardo Anselmi, 38 anos, exercitar um de seus hobbies favoritos. Desde a adolescência, o diretor industrial tem o hábito de acompanhar as mudanças climáticas, e o início da estação mais fria do ano, às 19h34min de segunda-feira, é a época perfeita para essa "brincadeira".
- Sempre fui muito apegado com as questões de geografia. Na escola, era minha disciplina preferida. Por volta dos 15 anos, quando ganhei meu primeiro computador com acesso a internet, passei a navegar por sites que me mostrassem dados sobre o clima em diversos lugares do mundo - lembra.
Conforme o guri crescia, aumentava também a vontade de descobrir curiosidades a respeito do tempo. Adorava sair campo afora nos dias frios para registrar em fotos a paisagem congelada em dias de geada.
Mas não era o bastante. Anselmi queria mais detalhes. As informações sobre as temperaturas mínimas e máximas que obtinha por meio das estações meteorológicas oficiais não eram suficientes para saciá-lo. Em agosto de 2002, durante uma viagem à Alemanha, viu em uma vitrine o anúncio de uma estação meteorológica automática e comprou o equipamento. Na volta ao Brasil, instalou o dispositivo no alto da malharia da família, em Farroupilha.
- Essa estação jogava os dados para a internet, em um site dos Estados Unidos. Na época, havia apenas uma estação brasileira cadastrada nesse site, localizada em São Paulo. Quando alguém acessava o endereço, podia ver os dados da Estação Anselmi, e eram dados muito semelhantes aos do Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet) - conta.
Com o tempo, o administrador aprendeu que a temperatura variava bastante entre diferentes área da mesma cidade e, 2004, instalou outra estação na chácara da família, na localidade de Linha Vicentina, entre Farroupilha e Bento Gonçalves. Localizada em um vale, Linha Vicentina costuma registrar temperaturas mínimas muito menores do que a área urbana da cidade, cuja altitude é maior. Na última terça-feira, por exemplo, a mínima na estação sobre a empresa, por exemplo, foi de -3ºC, enquanto que a da chácara foi de -7ºC.
- As diferenças são gritantes entre um local alto e uma baixada, que podem chegar a 10°C. Mesmo assim, eu não estava contente, e queria instalar outro equipamento na região mais fria do Estado. E então em 2014, instalei uma estação na Fazenda Potreirinhos. Assim, consigo ter os registros em diferentes regiões e altitudes - explica Anselmi, que acessa os dados via internet.
O gosto pelas baixas temperaturas é tanto que, certa vez, diante da previsão de um frio que se anunciava glacial, saiu de Farroupilha com um amigo por volta das 18h para acampar junto ao Pico do Monte Negro. Com 1.403 metros de altitude, é o ponto mais alto do Rio Grande do Sul, localizado a 45 quilômetros da sede de Ausentes.
- Estacionamos o carro na base do monte e acampamos por lá. A temperatura em um termômetro digital chegou a marcar -9ºC, e as portas da camionete chegaram a lacrar com o congelamento.
O galo do tempo
Ele não faz previsões, apenas muda de cor conforme a umidade do ar e sinalizava chuva ou sol. Mesmo assim, ficou eternizado como o galo do tempo. Se estiver com a tonalidade rosa (e suas variações) é um indício de que provavelmente o tempo está chuvoso e meio frio. Se o galo "azular", o dia apresenta-se quente, sem precipitações.Na verdade, os galinhos não conseguem determinar as variações do tempo no futuro, apenas servem para registrar as nuances do clima no momento.
O "truque" é fruto de um equilíbrio químico, a partir de uma solução aquosa de cloreto de cobalto II em sua superfície. Em dias quentes (temperatura alta), o equilíbrio da reação se desloca no sentido da reação que absorve calor (endotérmica), nesse caso, a inversa. O galo fica, então, azul, confirmando que o tempo será de calor. Nos dias frios, a temperatura baixa faz com que o equilíbrio seja deslocado no sentido da reação que libera calor (exotérmica). Nesse caso, o galinho fica rosa, confirmando que será um dia frio. Porém, em locais com ar-condicionado, a cor do galo acompanha a temperatura do ambiente, mesmo que lá fora o oposto se apresente.
Mais um lúdico artifício do que uma confiável fonte de previsões meteorológicas, o galinho encantava principalmente as crianças. Na casa dos avôs e avós, ainda é possível encontrá-lo, dentro de alguma cristaleira, agora bem distante da condição de item obrigatório nos lares de antigamente. (Rodrigo Lopes)