O Dia de Finados serve para recordarmos de uma história que, por pouco, não permaneceria obscura e esquecida em um jazigo no Cemitério Público Municipal. Trata-se da passagem do químico industrial e cervejeiro alemão Karl Friedrich Henn por Caxias do Sul nas primeiras décadas do século passado.
Toda essa história começou a ser desvendada em setembro de 2002, quando o neto Rolf Blatt, 78 anos e atualmente morando em Brasília, desembarcou em Caxias em busca de informações sobre o avô que não chegou a conhecer. À época, Blatt não possuía dados muito precisos sobre Henn na cidade, apenas que ele havia trabalhado na antiga Cervejaria Leonardelli e morrido aqui. O destino do corpo era desconhecido.
Esse mesmo destino, porém, tratou de ajudar a esclarecer os fatos. Após parar na Av. Júlio de Castilhos, em São Pelegrino, Blatt adentrou uma garagem de carros, onde pediu informações sobre a antiga cervejaria e os descendentes da família. Coincidências à parte, o dono do estacionamento conhecia um deles.
Após um breve telefonema, o neto acabou indo parar no casarão de João Carlos Leonardelli, bisneto dos fundadores da cervejaria. Foi onde Blatt terminou de montar o quebra-cabeça sobre a trajetória do avô em Caxias.
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De Curitiba para Caxias
Importante empresário do setor, Henn comandou por anos a famosa Cervejaria Atlântica, em Curitiba. Porém, após perder a fábrica e, por consequência, separar-se da esposa Amelie Ida Fell, o engenheiro deixou a capital paranaense e rumou à Serra Gaúcha.
Chegado a Caxias em meados dos anos 1920, ele logo arranjou trabalho como químico na primeira sede da Cervejaria Irmãos Leonardelli, então localizada no terreno da atual rodoviária.
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Com formação em Química Industrial pela Universidade de Heidelberg e vasta experiência na área, ele atuou por anos na fábrica caxiense, agora como empregado. Porém, em função da perda do antigo status social e do rico patrimônio – e ainda impactado pela separação da esposa –, o alemão acabou sucumbindo à bebida, vindo a falecer em 15 de agosto de 1936 – vítima de cirrose hepática, segundo o laudo emitido pelo médico Felix Spinato.
Mas, ao contrário do que imaginava o neto, o corpo do avô não teve destino incerto. Como habitou a casa dos Leonardelli até seus últimos dias – sendo praticamente adotado e cuidado por eles –, o químico foi enterrado no jazigo da família, no Cemitério Público Municipal.
Karl Friedrich Henn tinha 56 anos.
Foto no jazigo
Até 2002, a identidade e a data de nascimento e óbito de Carlos Henn não constavam nas gavetas do jazigo dos Leonardelli, apesar de os restos mortais do alemão estarem depositados lá desde 1936.
Motivo? A família simplesmente não dispunha de fotos e dados do morto. Essa ausência, porém, foi compensada com o envio de várias imagens, documentos e certidões pelo neto Rolf Blatt à família Leonardelli - o que pôs fim a uma "espera" de quase 70 anos.
A família
Karl Friedrich Henn – no Brasil, Carlos Frederico Henn – nasceu em 9 de fevereiro de 1880 em Heidelberg, na Alemanha. Após emigrar para o Brasil já adulto e fixar-se em São Paulo, em maio de 1912 ele retornou a Alemanha, onde casou-se com a pianista Amelie Ida Fell na cidade de Karlsruhe. Dessa união nasceram três filhos: Ilse Dolores, Wiltrud e Felix.
Visitas ao pai
Mãe de Rolf Blatt, a primogênita Ilse Dolores nasceu em julho de 1913, já em Curitiba, para onde a família deslocou-se posteriormente. Porém, mesmo após a separação dos pais, Ilse seguidamente visitava e passava temporadas com Henn em Caxias, nos anos 1930. Era quando convivia com as famílias Leonardelli e Braghirolli e participava dos cortejos da então iniciante Festa da Uva.
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Parceria
Informações e fotos desta coluna são uma colaboração de João Carlos Leonardelli e Rolf Blatt, neto de Carlos Frederico Henn.
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