Conheci, nesta semana, o axolote, um anfíbio bonitinho da família das salamandras, que parece saído de um desenho animado. Conheci é modo de dizer, já que não o vi, apenas fiquei sabendo da existência dele por causa de uma analogia pessoal muito fofa e tive que pesquisar. Descobri que ele é originário do México e o nome homenageia o deus asteca Xolotl, responsável pelo fogo e pela iluminação.
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Chegou a ser objeto de inspiração do escritor argentino Julio Cortázar, que o descreveu como "um corpinho rosado e parecendo translúcido (pensei nas estatuetas chinesas de vidro leitoso), semelhante a um pequeno lagarto de 15 centímetros, terminado em um rabo de peixe de uma delicadeza extraordinária, a parte mais sensível do nosso corpo".
A parte curiosa desse bichinho é justamente que, ao contrário das outras salamandras, ele atinge a maturidade sexual sem passar pela metamorfose, vivendo sempre adolescente. Tipo Peter Pan! Quem não conhece um monte de gente assim, que parece presa em um momento específico da vida e não ousa fazer a travessia?
Mas, voltando ao animal, esse nem é o lado mais interessante dele. O axolote tem uma extraordinária capacidade de regeneração, inigualável na vida selvagem. Ele consegue regenerar grandes partes do corpo, inclusive um olho inteiro, parte do coração e do cérebro. Se perde uma extremidade, ela pode ser recuperada em questão de semanas — com todos os ossos, músculos e nervos no lugar certo. Consegue, também, reparar inteiramente a medula espinhal quando ela sofre uma lesão e recupera feridas sem deixar cicatrizes.
Foi justamente essa capacidade que me encantou. Ou, pensando melhor, fiquei morrendo de inveja dela.
Imagina se tivéssemos a chance de melhorar, em semanas, de cada golpe que a vida nos dá? Se pudéssemos consertar um coração machucado ou uma dor de cotovelo com um processo puramente biológico?
Ok, temos a possibilidade de recriar nosso presente a cada instante, podemos transformar nosso dia a dia, nos darmos segundas oportunidades de melhorias... Mas isso não é sempre, não é para todo mundo e exige confiança, esforço e coragem para fazer acontecer.
Quem olha a imagem do axolote sorrindo e nadando tranquilamente pode ter certeza que a recompensa por se permitir reconstruir é a própria vida nova que começa, cheia de expectativa pelo recomeço. Uma carinha feliz de quem está vivendo. E a gente ainda pode fazer isso de um jeito mais pleno do que ele, por ter tido a capacidade de fazer a travessia.