Pergunte sobre mim para alguns vizinhos do meu prédio e imediatamente você verá alguns narizes torcidos. Longe de mim querer ser gostado por todos, então essa fama de “chato do grupo” não é algo que me incomode. E também não é sobre ser do contra, por mais que muitos acreditem piamente que gente como eu sempre queira complicar tudo. A verdade é que, ao menos para mim, há um valor gigantesco em cada questionamento. “Será que tem que ser assim?” ou “e se pensarmos de outra forma?” são frases bem-vindas por aqui, e quase sempre mal recebidas do lado de lá.
Embora possa parecer irritante, ser “o chato do grupo” me soa como um papel essencial — seja em um grupo de amigos, de trabalho ou até mesmo de condomínio. Em qualquer coletivo é necessária essa dose de antídoto contra o conformismo, ou seja, aquelas pessoas que desafiem a harmonia superficial para fomentar o progresso que for. Até porque, a discordância é o que faz os grupos evoluírem, obrigando todos a reavaliarem certezas e saírem das bolhas de ideias confortáveis.
Discordar é muitas vezes visto como um incômodo. Em uma era onde redes sociais nos conectam com quem pensa como nós, a concordância é quase sempre o pano de fundo — só a desencontramos ao trocar de nicho, de espaços de convívio, de perfis a serem seguidos no Instagram. Contudo, até mesmo do outro lado da porta do corredor de casa é possível encontrar alguém que seja o completo oposto. Ou seja, o contraponto mora na porta ao lado.
Se nos pautarmos na história, a própria mostra que grandes avanços vêm da ruptura com o status quo. Copérnico foi o chato que disse que a Terra não era o centro do universo, contrariando séculos de crença. Galileu foi o chato que se opôs à Igreja, e por aí vai. Os discordantes, como pensadores, cientistas e artistas que desafiaram normas estabelecidas, foram os que impulsionaram o mundo para frente. Longe de mim querer me enquadrar neste grupo ou soar pretensioso. Eu só não me preocupo com a parte quase pejorativa da coisa mesmo: a alcunha de chato. Se o sinônimo for alguém que desafia o consenso e constrói um coletivo mais saudável, pode me chamar do que for.
Essa irritação toda causada pelo questionamento — que muitas vezes vem sempre da mesma pessoa — é reflexo da nossa resistência à incerteza. Concordar é fácil demais (quando não, apenas um efeito manada). Já questionar exige esforço, e é nesse esforço que boas ideias são refinadas.
Há quem resuma tudo isso em inconveniência, teimosia, ou até desejo de atenção. E sim: nós, chatos, somos vários, somos diversos, e temos propósitos distintos. De novo, sem querer me incluir na caixinha dos “chatos legais”, mas bato no peito ao afirmar que o papel crucial desempenhado por alguém que traz um ponto de vista até então não pontuado, por mais atraso que gere ao todo, ainda assim torna essa persona (muitas vezes non grata) o agente da inquietação necessária.
Seja onde for, alguém precisa ser o chato. Sem ele, não há discordância. Sem discordância, não há debate — e sem debate, não há evolução.