Ganhei o meu primeiro concurso literário com 14 anos e não fui buscar o prêmio por conta da timidez. O texto em questão surgiu despretensiosamente e sem ambição nenhuma – vencer não era um desejo. Participando por participar, não consegui dar valor ao momento como supostamente deveria. Nos anos seguintes, a carreira me trouxe algumas outras premiações, e salva a função de enfeitar currículo, ainda questiono seus reais significados.
Que o ser humano vive em uma busca constante por aprovação já sabemos. Talvez seja por isso mesmo que os concursos perdurem há tanto: nós “precisamos” dessa validação (ou melhor, nós queremos). É como se o julgamento nos concedesse a permissão de continuarmos fazendo aquilo que, veja só, já fazemos. Aquilo que sabemos fazer. E como sabemos? Bem, se fazemos é porque existe uma necessidade e a mesma é procurada e atendida. No caso, o mundo por si só já funciona naturalmente como um concurso – o júri é ativo e muito exigente.
Em 2017, criei o meu próprio concurso literário e o permiti existir durante três anos. Analisando hoje, foi até tempo demais para me dar conta de que eu mais frustrava sonhos e aspirantes à escrita do que valorizava e incentivava talentos. Ao escolher meia dúzia, pretere-se todo o resto. E quando é que estamos prontos, de verdade, para julgar o outro? Quantos diplomas e livros lidos são necessários para ranquear a arte de alguém (esta, legitimada como uma expressão particular e subjetiva)? Ou ainda: quantos prêmios no currículo me tornam apto para passar a premiar?
Importante frisar que um júri é composto, muitas vezes, por pouquíssimas pessoas. É um mero recorte, então. Apenas uma parte que, sendo a arte o que é, talvez nem possa representar a maioria (muito menos o todo). Tirei essa prova quando enviei o mesmo material dois anos seguidos para um concurso e obtive resultados diferentes. Ou ainda, quando vi “o melhor livro do ano” segundo uma premiação nacional ser ignorado no concurso do lugar onde nasceu.
E por falar em mistérios não desvendados, cito a vez em que Fernando Pessoa teria ficado em segundo lugar em uma premiação, lá em 1934, não fosse o lobby formado nos bastidores que criou uma outra categoria para favorecê-lo. Esse tal burburinho que circula pelas premiações não é novidade: como não lembrar do Nobel de Literatura concedido a Bob Marley em 2016, ou ainda das polêmicas que até hoje abraçam o Jabuti? Talvez eu devesse ter encarado como sinal a vez em que fui premiado e no dia seguinte ligaram para me tomar o prêmio...
A mesma parcialidade cultural acontece em qualquer outra área. Após sofrer um visível boicote, o cantor The Weeknd declarou que não submeterá mais os seus trabalhos ao Grammy. Da mesma forma, Frank Ocean também foi contra esse costume social de validação e, feliz pelo seu trabalhado ser reconhecido por aqueles que o sustentam (em todos os âmbitos), cravou: “ganhar um prêmio não me batiza como um sucesso”.
Passando para as telonas, um filme com 90 e poucos por cento de aprovação da crítica não se sustenta se o público não tiver gostado. O cinema não lota, as contas não fecham, o projeto não se paga. Morre ali um roteirista, um diretor, a carreira de tantos atores e atrizes.
Pensando assim, troféus são relativos. Há os de pedra e os de madeira, os de metal ou de vidro. Eu mesmo prefiro aqueles sonoros: uma boa salva de palmas pode significar tanto... – assim como o real leitor de um livro, por exemplo, que serve como o único termômetro necessário para que um escritor continue existindo.
Sendo assim, não me sentindo mais representado por um sistema potencialmente falido, ao menos nessa área estou me aposentando.