Escutei em uma palestra que se tirássemos fora a cabeça das pessoas, muitos dos seus problemas estariam resolvidos. Na mesma hora lembrei de Maria Antonieta na guilhotina no final dos anos 1700, por mais que a palestrante não estivesse sendo tão literal assim. A metáfora era para ilustrar que muito daquilo que carregamos tem origem dentro da mente, e só então, com a nossa permissão, tudo se espalha para o corpo.
A ideia em questão era da geriatra Roberta França e surgiu a partir de um aprendizado que ela teve com um professor da faculdade. Segundo ele, “quando tudo dói, a dor não é física”. Isso faz da dor, então, uma construção gradual que desperta e reside na cabeça (e cabe a nós decidirmos quanto espaço ela terá antes de se alastrar). É aquela velha máxima de “mente sã, corpo são” — mas convenhamos que aqueles que atualmente conseguem praticar essa filosofia merecem um cantinho no livro dos recordes.
Junto a tantos avanços, o mundo moderno nos brinda com diversas dores. Seja uma enxaqueca, crise de herpes, perda de cabelo, falta de sono, dores nas costas, palpitações, náuseas ou tantos outros sintomas que permeiam nosso dia a dia. A partir daí, o protocolo que cada um de nós segue é quase sempre o mesmo: uma rotina incansável de médicos e uma bateria de exames para tentar descobrir qual é a doença misteriosa da vez. E, veja bem, estamos todos errados — até porque, o ponto de partida deveria ser outro.
Acontece que essa dor — que na verdade vem da alma — chacoalha a gente porque nos quer despertos em um mundo onde caminhamos semiacordados, dopados e acostumados aos terremotos. Quando tudo dói, é sinal de que o corpo está pedindo socorro, e em silêncio ele usa todos os sintomas à disposição como alerta para que a gente perceba: alguma coisa está sendo feita da forma errada.
No fim do dia, cuidar de nós mesmos fica como último dever da lista de tarefas. E quando cuidamos, fazemos questão de bater no peito que tomamos tal remédio, usamos o creme facial daquela marca importada, além de não ficar um dia sem cápsulas de colágeno e Ômega 3.
Ou seja, é tudo de fora para dentro.
Tenho uma amiga que é especialista em pele há mais tempo do que minha idade. Ela faz questão de deixar claro todas as vezes em que nos encontramos: estamos fazendo o contrário do que deveria ser feito; é preciso tratar o corpo de dentro para fora. Cada órgão é responsável por alguma coisa, e quando ele falha, é sinal de que estamos faltando com algo específico que claramente não será resolvido com pomadas e cremes (no máximo será remediado). Uma simples pausa seria o suficiente para nos escutarmos: onde é que dói? E como podemos agir — de dentro para fora — a fim de causar uma mudança efetiva?
Fulano não está louco da cabeça porque todos nós estamos, isso sim. E quer saber? No fim das contas, Maria Antonieta teve sorte.