A ideia de que um dia, talvez, teremos de encarar o mundo sem os nossos pais sempre esteve ali, acomodada em um canto que mal fazemos questão de lembrar. Sabemos que isso pode acontecer em algum momento, porém é mais fácil se apenas lidarmos com o dia a dia e todos os seus desdobramentos. Apesar de estar ciente sobre isso, nunca senti, de fato, como seria uma vida sem os meus pais por perto.
Eis que meu pai machucou o joelho jogando futebol e precisou do apoio de um par de muletas. Foi um mês inteiro onde ele pôde sair pouquíssimo de casa, então automaticamente todas as suas tarefas foram transferidas para mim e para a minha mãe. Desde algumas atividades básicas (como ir ao mercado), até burocracias que só o meu pai saberia resolver mas que precisamos dar conta. Durante o período, precisei pilotar algumas coisas que meu pai pilotava – inclusive o seu carro! – e foi aí que o medo tomou conta sem nem pedir licença.
Não seria o caso de exagerar, mas o fato de ver meu pai incapacitado para desempenhar diversas atividades fez com que algum mecanismo de defesa ligasse o sinal de alerta em mim. Imediatamente, passei a me questionar sobre tudo aquilo que eu nunca aprendi a fazer porque sei que meu pai faz. E aqui eu falo até mesmo de um singelo e bem centralizado furo na parede para pendurar um quadro.
A maior angústia é saber que aprendemos. Na ausência de alguém que nos ensine, aprendemos por conta. Nós damos um jeito, mesmo que seja em meio à dor. E é justamente essa ausência que tentamos tanto evitar – falei sobre isso com dois amigos e a certa altura tivemos que trocar de assunto, dado o medo de imaginar como será o mundo quando os nossos pais se forem. Se é que a vida não nos pregar outras peças.
Não sei onde fica o cara que meu pai levou o controle para trocar a bateria dias atrás. Não sei fazer cálculos e planilhas para controlar despesas. Não sei o melhor atalho daquela estrada que vai nos levar ao mesmo lugar, só que muito mais rápido. Não sei se vou saber responder quando um dia perguntarem qual era a música favorita do meu pai.
O que eu sei é que o tempo é traiçoeiro e o destino mais ainda. Sempre soubemos que a vida é assim, e que os ciclos se encerram naturalmente, tudo como deve ser. Mas quem é que está preparado para o dia que ninguém quer que chegue? Na dúvida, melhor me adiantar: pai, qual é a tua música favorita?