Estou em processo de esvaziamento. Se a expressão é nova, explico (até porque, acabo de inventar). Dias atrás me peguei pensando nessa ideia de que a gente passa muitos anos acumulando tudo aquilo que sempre quis – e quase sempre isso são coisas materiais –, até a hora em que nos vemos rodeados daquilo que chamo de “muito”. Foi assim comigo, que só me vi realizado quando construí uma estante para poder organizar todos os meus livros, por exemplo. O mesmo aconteceu com a minha coleção de filmes de terror, meus frascos de perfume, e por aí vai... Até que eu olhei para tudo isso e senti falta daquilo que chamo de “pouco”.
Não estou levantando bandeira contra o costume de cultivar suas próprias coleções, muito menos o de conquistar aquilo que tanto se deseja. O ponto aqui são os excessos mesmo, aquele acúmulo de itens que até podem ter feito sentido, mas que passam a ser uma decoração empoeirada ou só ocupam espaço escondidos nos armários mesmo.
O desapego exige um amadurecimento emocional, já que na maioria das vezes acaba sendo doloroso. Não tem como: chegamos a sentir que estamos perdendo uma parte da gente. E pensando bem, estamos mesmo, já que até as coisas materiais representam um pouco daquilo que nós somos.
Nos últimos tempos, o minimalismo é um conceito que tem se alastrado por aí e que se choca com uma sociedade capitalista cujo consumo é desenfreado e descartável. Não sei dizer se em algum momento acreditei que isso seria para mim, ou até se li algum artigo que me encorajou a pensar diferente. Fato é que eu me senti perdido em meio a tanta coisa que amo, mas que ocupa aquele espaço de respiro e calmaria que deveria ser meu.
Lá atrás, seguidamente eu questionava os meus pais sobre as cores da nossa casa. Eu reclamava porque todos os cômodos eram brancos, com no máximo um tom de madeira aqui ou ali, alegando que tudo era sem graça e frio. Hoje, acho que entendo eles um pouco mais. Precisamos de espaços livres para nos esvaziarmos, principalmente depois de um dia acumulando o “muito”.
Por enquanto, a minha casa continua bem colorida, porém tenho me livrado de vários itens que, mesmo marcados na minha história, hoje já não cabem mais na minha estante. Aos poucos, diminuo o meu “muito”, e toda vez que vejo uma prateleira se esvaziar, entendo que ali já existiu tanta coisa que agora é o tempo certo para deixá-las ir. E quem fica sou eu - menos sufocado, menos perdido nos meus reflexos, e ao mesmo tempo mais derramado em mim e só. E é aí que eu tenho a certeza de que esse é o “pouco” que me basta.