Era um dia lindo de 2002 quando eu cheguei da escola e a minha mãe estava sentada na poltrona da sala com a cabeça baixa. Eu ainda era pequeno e pouco entendia sobre as dores dos outros, mas era inegável a sensação de que alguma coisa não estava certa. Tudo poderia ser bem pior, é claro, mas naquele dia eu descobri que a minha mãe havia sido demitida, e tenho certeza de que a notícia foi muito pior para mim do que para ela.
A pergunta que invadiu a minha cabeça de criança que ainda tentava entender o mundo foi uma só: e agora?!
Meus pais precisaram me tranquilizar porque aquilo havia sido um choque. Era tão natural conviver com a ideia de que eles trabalhavam dez, quinze, vinte anos na mesma empresa, que pensar em um desligamento tão abrupto era tarefa quase irracional. Meu senso de filho (único, ainda por cima) gritava por respostas, e a vontade era olhar na cara do (ex) chefe da minha mãe e perguntar que diabos ele estava pensando. Mas não fiz, tá? (Só para deixar claro).
O mais engraçado é analisar que eu sou uma pessoa totalmente diferente hoje.
Quando meu pai deixou o seu último “emprego tradicional” em uma “empresa tradicional”, lá em 2015, eu agradeci a todos os Deuses do universo. Foi a partir dali que a nossa convivência estreitou e pude dividir momentos importantes da minha vida ao seu lado – coisa que eu jamais imaginaria tempos antes. No final do ano seguinte foi a minha vez de pegar a família de surpresa, quando tomei a decisão de chutar o balde e pedir demissão do meu “emprego tradicional”. Acho que foi a vez da minha mãe querer gritar comigo e perguntar que diabos eu estava pensando.
Para a minha surpresa, mesmo tendo pai e mãe que conviveram uma vida toda batendo o cartão ponto às 7h e às 18h, eles aceitaram, e, pouco a pouco, entenderam o filho criativo-louco-intenso que haviam criado. E foi aí que eu fiz jus a uma das maiores filosofias da geração Y (mais reforçada ainda pela geração Z e atualmente pela Alpha): não nascemos para criar (e aceitar) raízes.
Os poucos anos que trabalhei em “empregos tradicionais” de “empresas tradicionais” com “filosofias tradicionais” foram o suficiente para ter a certeza de que somos gerações empreendedoras e, principalmente, ansiosas. Desculpe, mas não posso esperar o seu sistema complexo de hierarquia que vai me fazer refém de metas inalcançáveis que nem posso chamar de minhas. O mundo está lá fora, ele tem urgência assim como eu. Ele me chama.
Na última semana, a apresentadora e atriz Maisa Silva escolheu deixar o SBT, canal onde trabalhou durante 13 anos. Com apenas 18 anos de idade e uma carreira de 15, muitos foram os que revidaram à notícia com alertas de “você vai se arrepender”. Já ela, mais decidida do que nunca, respondeu com outro resumo das novas gerações: o que eu tinha para fazer, já fiz. Acomodar-se não é uma opção – nem mesmo quando você está no topo. Tem vezes que é preciso olhar para baixo, encarar a altura, e escolher voar. E nós só saberemos se vai ser um plano bem sucedido se nos jogarmos de cabeça. Do contrário, permaneceremos com pés fincados à falsa ideia de que o comodismo nos mantém. Pior: de que ele é o suficiente.