Na vibração de Aquário, dei de lembrar de velhos e sumidos amigos. Senti o sorriso se alargar, enquanto a tela da memória ia exibindo cenas já quase perdidas. Tantas histórias, tantas emoções! Tantos encontros que ainda alegram meu coração! Por tudo o que oferece de apoio e cumplicidade, a amizade é condição de sobrevivência. Ninguém vive sem um amigo, ainda que imaginário, com quem possa ter alguma interlocução para não enlouquecer de si mesmo – vide o Wilson do náufrago Tom Hanks.
Tristemente, nesse tempo de faturas e fraturas pela passagem de Saturno por Aquário, dou-me conta de quantas amizades se desmancharam ou saíram abaladas por recentes divergências ideológicas. Não quero entrar no mérito do que é perdoável ou não na visão social dos nossos companheiros. Confesso que não sei ainda como aceitar a desumanidade de certos discursos de pessoas por quem eu nutria enorme admiração. Algo se quebrou. Como consertar?
Essa crise federal nas amizades é apenas mais uma a envolver temas aquarianos, como o futuro e o ideal de humanidade. O futuro, é óbvio, soa sempre mais difícil quando não nos vemos em grupo. Pois para onde iremos se já não partilhamos sonhos? Quanto ao ideal de humanidade, que pressupõe uma aceitação da natural diversidade humana, como dar vez a quem nega os direitos mais básicos da espécie? Não são questões fáceis de responder. São pautas para os próximos 20 anos, no desdobrar do encontro de Júpiter e Saturno em Aquário, ocorrido em 2020, e quando também se dará a passagem do transformador Plutão pelo mesmo signo.
Na esperança de cerzir os rasgões que o desvario político andou a efetuar no tecido de tantos afetos, só posso mesmo, aqui e agora, é enaltecer o valor da amizade. Quero cantar a amizade, como quem canta numa roda de violão a alegria de viver. Que soe desafinado o canto, assim como somos imperfeitos, pois amigos verdadeiros conhecem nossos defeitos, mas não nos julgam somente por estes. Então, busco no cancioneiro da memória hinos à amizade, como a invocar seu sentido superior.
“Amigo é coisa pra se guardar / Debaixo de sete chaves / Dentro do coração”, assim começa a Canção da América, dos amigos de fé Milton Nascimento e Fernando Brant. Sim, lugar de amigo é no lado esquerdo do peito. Mesmo que o tempo e a distância digam não, o coração se encarrega de preservar a seiva do vínculo. Coração é casa de amigos. E embora tenhamos relativizado o termo amigo, estendendo-o a meros conhecidos das redes sociais, o coração sabe bem quem nele vive sem pagar aluguel.
“Os verdadeiros amigos / Do peito, de fé, os melhores amigos / Não trazem dentro da boca / Palavras fingidas ou falsas histórias / Sabem entender o silêncio / E manter a presença mesmo quando ausentes”. Agora os versos são de Renato Teixeira, na linda Amizade Sincera. A canção identifica a essência da verdadeira amizade como um amor desapegado mas atento. Manter a presença mesmo quando ausentes: pode haver arte mais bela nas relações humanas?
Ah, mas são tantos os motivos que podem ameaçar uma amizade. Joyce Moreno fala disso em Revendo Amigos: “No entanto, cadê meus amigos / Vai ver que a poeira do tempo levou / A barra da vida tem muitos perigos / E a gente se afasta sem querer / Se esquece sem querer / Se perde dos velhos amigos”.
E aí vem esse Sol aquariano a nos lembrar da bênção da amizade. Então eu sonho com um tempo de conciliações, abraços e risos. Quando a amizade voltará a voar, linda e livre, muito acima do que nos desune.