A floresta vira pastagem enquanto passa a boiada da estupidez. Gado vira metáfora de cegueira ideológica, mugidos viram xingamentos. A carne bovina dispara no preço, a bancada do boi culpa o dólar. Lideranças pregam aglomerações para uma suposta imunidade de rebanho. E o Brasil – feito uma vaca louca e ao som de um berrante – vai para o brejo. Já reparou como nossa realidade anda absurdamente bovina? Será efeito da passagem de Urano por Touro?
No espelhamento simbólico entre céu e terra, imagens recorrentes são ricas em significados. Touro é um signo de terra, ligado aos recursos e forças que nos sustentam materialmente. Já Urano, o astro das utopias e rebeliões, nessa passagem taurina até 2026, evidencia as fragilidades de nosso modelo econômico e pressiona a criação de saídas alternativas. O que antes parecia sólido está a se quebrar. É hora de reinvenções.
Touro simboliza a nossa primeira relação com a dimensão material da vida. Aqui, o suor do rosto vira pão, como na máxima religiosa endossada pelo capitalismo. Coincidência ou não, o mês de maio começa com boa parte do mundo celebrando o Dia do Trabalho. É feriado em muitos países, numa exaltação à força do trabalhador na promoção do bem-estar pessoal e na construção da riqueza das nações. Oh, que bom que as sociedades reconhecem a gestão humana por detrás das engrenagens industriais! No entanto, essa história carece de exatidão.
Melhor seria se o Dia do Trabalho se chamasse Dia da Consciência do Trabalhador. Porque o feriado evoca uma vitoriosa greve geral ocorrida em 1º de maio de 1886, em Chicago, quando operários brigaram pela redução de uma jornada de trabalho que chegava a 17 horas por dia. Naquela ocasião, Urano e Saturno estavam em ângulo tenso no céu, o mesmo ângulo de agora, reativando o conflito mítico entre o novo e o antigo e impondo ajustes num âmbito coletivo e humanista.
Em sua condição de turbulento despertador, Urano costuma abalar a dita zona de conforto – e esse choque contraria as naturais opções taurinas por estabilidade e duração. O astrólogo Dane Rudhyar comparava o efeito de Urano a uma cachoeira que irrompesse de repente no leito calmo de um rio. Não há como voltar à placidez de antes. O que se deve fazer é explorar o potencial de energia presente na cachoeira e gerar novas luzes. Porém, como signo de resistência, Touro não aceita facilmente essa mudança de viés. Mais ainda quando Saturno tenta barrar as inovações uranianas.
Como no mito Saturno castrou Urano, fico a pensar também na castração que relega um pujante touro à condição passiva de boi gordo. O animal que representa o signo é um touro
fértil e robusto, mas não é raro essa potência ser domesticada até uma acomodação rígida e nada criativa. Nem precisa haver a castração literal: pastos verdes e cercas seguras farão os touros se distraírem até o completo esquecimento de sua força e de seus reais desejos.
O Brasil tem Saturno em Touro no mapa astrológico, bem no lugar por onde hoje passa o iluminador Urano. Se ideologias e outras velhas crenças definiram trilhos de obediência e resignação, convencendo o país de sua eterna condição bovina – “povo marcado, eh, povo feliz” –, as crises no mundo material hão de gerar rupturas. Faz muito tempo, um taurino uraniano chamado Karl Marx já avisou sobre isso. Mas o gado manso, fiel à adoração de um enganoso bezerro de ouro, já não reconhece o touro em si. Como sair do induzido torpor que o conduz direto ao matadouro? Eia, boi Brasil: é tempo de acordar!