Não é o que parece. Aliás, é o oposto do que parece ser.
Sabe o Coppola? Naturalmente, o cineasta Francis Ford e não o Caio Coppolla da tevê. Pois então, o Coppola, o responsável por filmes como a trilogia O Poderoso Chefão e Apocalypse Now, está mergulhado em uma nova trama cinematográfica. Antes, contudo, um parêntese.
(Crises econômicas – sim, navegando por mais uma delas e bem densa, apesar de o mercado nem ter sido alvejado com bombas de efeito moral – são sempre um excelente momento pra nos darmos conta de como as empresas tratam seus consumidores. Acabo de comprar duas garrafinhas, uma de chá e uma de água com gás. Assim que coloquei ambas na mesa, me senti traído, envolto em uma cilada ardilosa. É que o dito chá, daqueles pra ser bebido gelado, agora está sendo vendido em garrafinhas de 450ml e não mais de 500ml. Ou seja, ando pagando mais caro, visto que a inflação segue reajustando os preços, em troca de menos bebida).
Megalopolis, o novo filme do Coppola, iniciado há cerca de 20 anos, mas interrompido pelo simbólico 11 de Setembro, dizem, está em estágio bem avançado. Mas isso nada quer dizer, porque até ser lançado o Apocalypse Now, outros filmes dentro do filme tiveram de ser feitos. Enfim. Megalopolis é inspirado na Roma antiga (Coppola adora abordar Impérios), apesar de ambientado nos tempos atuais. No centro da trama, o cineasta aborda a Conspiração Catilinária em que o dito senador, após perder seguidas eleições consulares, proferia acusações de fraude nos pleitos, tinha a intenção de assassinar o cônsul Cícero, incendiar Roma e espalhar o caos.
(O mercado é feito de oportunidades. Dizem que o preço da colocação de vidro por metro quadrado duplicou na Capital Federal. Dizem, porque não moro lá e não sei se é verdade. Só sei que o Renato Russo cantava nos palcos do Planalto Central uma espécie de prévia do quebra-pau do último domingo: “Nas favelas, no Senado / Sujeira pra todo lado / Ninguém respeita a Constituição /Mas todos acreditam no futuro da nação”).
O Coppola, apesar de um realizador de sucesso, nunca soube lidar bem com as finanças. Apocalypse Now estourou o orçamento nos primeiros meses de produção, dizem, em mais de 20 milhões de dólares. Contudo, é célebre a entrevista em que ele reconhece que, apesar dos descaminhos no processo, o filme alcançou status de obra-prima: “Meu filme não é sobre o Vietnã, meu filme é o Vietnã. A forma como nós rodamos foi muito parecida com a presença norte-americana no Vietnã. Nós estávamos na selva, havia muitos de nós, tínhamos dinheiro em excesso, muito equipamento e, aos poucos, fomos perdendo nossa sanidade”.
(Perder a sanidade parece ser mais fácil do que ser traído. No meio do caminho há sempre uma garrafinha com menos conteúdo e custo maior, todo povo tem um Catilina querendo derrubar cônsules e estourar o orçamento é eufemismo com purpurina em tempos de inflação galopante. Não sei vocês, mas, pra mim, a pior sujeira pra limpar é vidro quebrado, porque daqui 100 anos alguém há de pisar nos cacos. Só perde, é claro, pro dejeto defecado fora do vaso).
O Brasil não é o Vietnã. O Brasil tem cara de Roma. O Brasil talvez seja a Megalopolis do Coppola. O Brasil não é o que parece. Aliás, o Brasil é o oposto do que parece ser.