Domingo invernal. Daquelas tardes em que as nuvens cinzentas quase na cor do chumbo teimam em se atravessar diante do sol. No interior, mais perto do mato, mais distante das edificações que atravancam nosso caminho, o vento frio se faz presente com ainda mais intensidade.
Apesar do inverno lá fora, dentro do Salão Paroquial de Forqueta havia um sedicioso foco de calor, provocado pelo sentimento de carinho e acolhimento, que brotava do encontro de dezenas de pessoas. Talvez por causa do forte vento, que comprometeu a rede de energia elétrica, não havia luz no espaço. Enquanto discorria o tempo da solenidade, a plateia permanecia sentada em cadeiras de madeira, cujo encosto é feito de trama de cordas. Nada por acaso, era como se estivéssemos n’outro tempo.
Observando as pessoas, ficava evidente perceber quem era a “gente da colônia” e a “gente da cidade”. Apesar das diferenças, todos misturados aguardavam o início do filó, última atividade da semana que culminaria com o fim de mais um ciclo de apresentações do Forqueta Cultural. O projeto é simples e se propõe a valorizar e perpetuar a tradição e cultura do povo da colônia e, ao mesmo tempo, ampliar o acesso à arte para quem mora no interior com performances de artistas da cidade realizadas no interior.
Antes do filó, ocorreu a entrega do Prêmio Caxias do Sul, proposição da vereadora Gladis Frizzo. E sabe que é nessas horas em que a gente percebe qual é o verdadeiro sentido do que as pessoas fazem. Porque o Robinson Cabral, produtor responsável pelo Forqueta Cultural, que recebia a honraria, poderia aproveitar o pedestal para surfar a boa onda da vaidade, enaltecendo a si por colocar o povo em destaque. O Robi não fez isso porque não vive de palanque.
O cara é constantemente criticado por provocar a cena cultural de Caxias, por vezes deixando a emoção aflorar em debates públicos. No entanto, sua luta – é importante reconhecer – é sempre pela construção de uma via de acesso à arte. E, para todos, não importa se é gente do interior, gente da Apae, gente da Apadev ou gente que habita a Praça Dante.
Robi foi sucinto em discurso ao receber o Prêmio Caxias: “Nosso papel é colocar essa gente no centro, é colocar essa gente que faz cultura em evidência”. E reconheceu que ele, sendo gente da cidade aprendeu muito com o povo da colônia, não apenas do que diz respeito ao que poderia ser interessante ao projeto, mas em se tratando da vida.
Penso em tudo isso como uma metáfora para surpresas como essa, recheadas de encanto, que a vida nos revela de quando em vez. Por isso, entendo que a poesia da vida está além dos versos impressos em um livro de poemas. O Forqueta Cultural não lança livros de poemas, mas a cada edição escreve um novo capítulo de uma história que valoriza o passado e constrói pontes de ternura para o futuro, com aquele aroma de comida da nonna.