Anatomia sobre duas rodas!
Augusto Borghetti Chinelatto, filho de Adalberto Luiz Chinelatto e Eveline Borghetti Chinelatto, é um minucioso virginiano formado em Arquitetura e Urbanismo que se aventura pelo universo da customização de motocicletas. É ele quem pilota a Cramento Motorcycles e que faz sucesso internacional. Natural de São Marcos, nosso entrevistado divide os dias com a namorada, Paloma Leoncio com quem tem uma filha, Maria Luiza, de um ano e três meses. Seu contato com a arte se iniciou ainda muito jovem acompanhando o trabalho de seu pai e logo após iniciar a faculdade, confirmou sua vocação para o métier.
Qual sua melhor lembrança da infância? Ajudar meu pai a pintar placas e faixas que fazia e ficar olhando ele montar os aviões de plastimodelismo que tinha aos montes. Foi meu primeiro contato com arte e trabalho manual.
Qual a passagem mais importante da tua biografia? Minha graduação em Arquitetura e Urbanismo, foi um momento incrível. Foi quando tive o primeiro trabalho reconhecido nacional e internacionalmente, independente de que rumo minha vida tomou a história não se apaga.
Como vislumbra a cena da customização e design autoral no Brasil? É um caminho sem volta, está cada vez maior, isso se deve a termos mais acesso a peças e equipamentos de qualidade e das próprias montadoras estarem enxergando as oficinas como parceiros. O design autoral como um todo está em evidência pela busca em resgatar a essência, pelo feito a mão, pela história que a peça carrega, pelo contato direto com o artista que dedicou muito tempo para a obra.
Como o andar de moto impacta a relação das pessoas com a cidade em que vivem? Uma motocicleta proporciona mobilidade urbana, que em grandes centros é essencial para o deslocamento. Como arquiteto já participei de estudos sobre o assunto e o aumento de seu uso, permite outro tipo de interação com a cidade.
Por que decidiu empreender na profissão de artesão de motocicletas? O fazer manual sempre esteve presente na minha vida, entrei na faculdade de arquitetura influenciado pelo dia a dia do meu pai que sempre tinha uma caneta de nanquim na mão e um rolo de papel vegetal na mesa. No decorrer no curso que já era completamente digital comecei a sentir falta de colocar a mão na massa, queria muito fazer algo que envolvesse criação, mas ao mesmo tempo estar presente em todo processo e não somente no projeto. Como as motocicletas já eram uma paixão antiga, pois já fui piloto de motocross, tudo se encaixou.
Um ícone do design: Chip Foose, é o primeiro a ser citado porque ainda influencia, é o cara “mão na massa”, que sai da prancheta para deitar embaixo do carro e martelar uma peça, que entende da teoria e da prática, e claro, é o mestre dos detalhes. Grandes nomes como Paulo Mendes da Rocha, Lina Bo Bardi, Sérgio Rodrigues, Joaquim Tenreiro, João Batista Vilanova Artigas, não podem faltar.
Como se caracteriza o design que desenvolve? Existem elementos que definem a tua assinatura? Acho que depende muito do que estou produzindo, me entrego ao máximo e busco conexão. O resultado é sempre a minha visão de mundo, mesmo que seja para aquele momento. Como definição com certeza a busca incansável pelo simples, pela qualidade de acabamento e o nível de detalhes. The devil is in the detail.
Qual foi o projeto de maior desafio? Empreender como um todo é um desafio. Como produto acredito que foi a Suzuki DR 650, quando assumi o projeto dela, não tinha o menor conhecimento com customizações, não tinha ferramentas nem espaço. Foi o legítimo passo maior que a perna, mas que não faltou foi vontade de fazer algo único. Então depois de idas e vindas, gastos inesperados, ela finalmente ficou pronta e quando divulguei as imagens imediatamente elas rodaram o mundo. Saiu em diversos sites e páginas internacionais de grande renome. Acho que foi uma escola para mim, com certeza foi o momento que percebi que minha arte não era mais local e tinha ganhado o mundo.
Quais os desafios de gerir uma marca autoral? Ao mesmo tempo que temos acesso a tudo muito rapidamente, as coisas mudam na mesma frequência. Então o grande desafio é inovar no meio de tanta informação, ser original. Apesar da internet ser imensa as plataformas que utilizamos para divulgar nosso trabalho e atingir nosso público são poucas. Além de gerar todo conteúdo da marca é preciso dominar as ferramentas dessas plataformas.
Como funciona seu processo criativo do projeto à execução? Tudo começa pelas referências, não somente as estudadas para um projeto em específico, mas a bagagem que carregamos da vivência, estamos cercados delas, basta enxergar. Após definir o que vai ser executado sempre vou para o papel, gosto de rabiscar, fazer anotações, desenhar em vários ângulos, criar um conceito. Mas acredito que não existem regras nessa etapa, tem peças que nascem na própria execução, porque ela já é algo físico, que pode ser manipulado e experimentado mais rapidamente que no papel, vai acontecendo.
Qual o arquétipo de quem busca por customização? Os apaixonados por arte e por duas rodas. Aquela pessoa que gosta de ter algo único, que tenha uma moto que não apenas a leve de um ponto ao outro, mas que carregue um pouco da sua personalidade.
Onde busca equilíbrio e harmonia, seja no ambiente profissional ou pessoal? Cada vez mais sair e ter contato com o natural, a calmaria, acredito que seja uma das poucas coisas que me fazem sentir pertencente ao todo. E no dia a dia na minha namorada, Paloma e minha filha, Maria Luiza.
Uma moto e uma rota dos sonhos: uma Cramento. A rota dos sonhos é não ter rota.
Fontes de inspiração? A natureza, com todas suas formas, cores, texturas e proporções.
Lugar preferido em casa? Já foi a sala, hoje é o lugar que a Maria Luiza estiver.
Uma palavra-chave: crie!
Qual a primeira coisa que fará quando a pandemia passar? Viajar com minha família, voltar a conhecer novos lugares, culturas, pessoas. Voltar a enxergar sorrisos, daqueles com a boca e não só com os olhos.