Há, basicamente, duas maneiras de reagir aos fatos: refletindo com prudência e só então tomando alguma atitude ou deixando-se guiar pelo primeiro impulso, ignorando a razão. É um dos eixos centrais da linhagem dos pensadores estoicos. Em um dizer mais sucinto: a escolha é sempre nossa.
O cômputo de tudo o que vivemos depende da forma como o interpretamos. Isso tem se tornado fundamental para mim. Eu poderia usar aqui a palavra contenção. Parar e analisar o que vai construindo o dia a dia. Mas, reconheço, haja disciplina! A teoria, na prática, é bem diversa. Portanto, tenho extremo cuidado em me entregar a determinados comportamentos. Só o faço após me certificar que se sustentam além do meu discurso verbal.
Não pretendo ser um político da filosofia, um sofista. De bom grado, convido amigos e conhecidos a vasculhar minhas condutas para ver se há coerência entre elas. Caso contrário, posso estar cedendo à mera vaidade intelectual, bastante perigosa, sobretudo em um universo polarizado onde a expressão “pós-verdade” passou a ser levada a sério por tantos.
Se você optar por uma existência meditada, refletida, perceberá: depois de certo tempo, a sua consciência ditará qual o caminho ideal a seguir. Para Platão, o mal é fruto da ignorância. O ser humano age a partir das suas convicções e a maioria delas são consequência das experiências pessoais. A vida saudável resulta do persistente estudo da realidade interna. As relações tendem a se tornar mais saudáveis se também vemos o outro como um ser complexo, forçando-nos a exercitar a tolerância para atingir o aprimoramento.
Vou ilustrar com um exemplo. Uma colega, ao notar algo que a desagrada, mesmo de ordem insignificante, transforma isso em um drama shakespeariano. Um objeto deslocado (segundo seus critérios) é suficiente para ela ter um surto. Chega a ser engraçado. Contudo, logo se torna disparatado. Inúmeras vezes eu lhe disse ser uma forte candidata a ter um ataque cardíaco. Sua resposta: “Eu sou assim!”
Infelizmente, só mudamos quando há comprometimento. Isso exige um esforço de grande envergadura e é comum desistir já no começo.
Cumpramos com nossas lições. No trabalho, em casa. Polir, aprimorar, crescer. O investimento é de longo prazo. É tão bonito acompanhar alguém disposto a colocar uma lupa sobre si. Consegue-se garimpar qualidades, reforçando-as; e os defeitos serão eliminados. Podemos fazer isso em qualquer hora e lugar. Basta acessar o modo boa vontade.
Reagir corretamente é o ponto central quando falamos em alcançar a serenidade. O controle sobre os fatos é limitado; porém, está em nós habitar o céu ou o inferno interior. A ideia de estar com a mente perturbada não me atrai. Faço exercícios espirituais em busca de refinamento. Preciso ser meu mestre para confrontar um mundo que expulsa o lento ofício de compor a alma.
Melhor ser tartaruga em um universo de lebres cansadas.