Nos últimos anos tenho refletido sobre a questão de quais aspectos da vida devem ser colocados de lado por estarem distanciados de um presumível controle. Provavelmente movido pelas leituras de textos da filosofia estoica procurei alargar o discernimento mental, introjetando o processo de aceitação do que deve nos preocupar ou simplesmente seguir seu curso. Passamos tempo demais reclamando de situações sobre às quais não temos ingerência alguma. A natureza é cega e recusa-se a ceder aos desejos pessoais. Castigos ou méritos são consequências das ações humanas. Tudo parece se sustentar no primado de causa e efeito. Pois bem, mais recentemente comecei a jogar luz sobre o quanto podemos, através do empenho individual, mudar os dispositivos internos. Ao longo da existência o cérebro forma uma sucessão de caminhos neurais, ocasionados pelos pensamentos repetitivos. E vamos, maquinalmente, percorrendo sem fim comportamentos idênticos. A expressão “sou assim” deveria ser substituído por “estou assim”. Isso requer um exaustivo trabalho de observação para conseguir promover mudanças neste campo, mas com esforço e tenacidade isso é possível. Já o constatei na prática. Para que essas alterações no modo de agir se realizem é preciso, em primeiro lugar, aplicar-se com afinco. Tantos seguem no piloto automático ou desistem, sem manter a perseverança necessária para alcançar a vitória da racionalidade.
Uma das razões que me tornam feliz é ser esse laboratório de experimentação, apesar de exigir renovada paciência e desvelo. Só há o provisório no campo das emoções, anulando a ideia de estruturas cerebrais estanques. Isso instiga o impulso de nos superarmos. Posso fracassar em determinadas ocasiões, mas nada provocará a desistência de certos propósitos. A velhice será capaz de me surpreender com o corpo fragilizado, porém, com o comprometimento de sustentar essa postura de mudança, indispensável para a expansão do meu mundo interior. É como se tivéssemos nas mãos as rédeas do próprio destino. Há de se compreender os mecanismos sutis do inconsciente. Estudar as teorias freudianas é essencial. Elas perpassam as gerações com impressionante atualidade. O entendimento de si acontece aos poucos, aumentando na medida da atenção destinada aos mecanismos da psique. Ser não significa permanecer. Fico exultante ao deixar para trás algo que me incomodava. Olho os demônios de frente e os convoco para o confronto. Acredito na capacidade de vencê-los. O fundamental é tornar-se cônscio, angariando poder. Conversar longamente consigo, sem medo de enfrentar aspectos sombrios, tantas vezes camuflados.
Desvio o olhar do passado e direciono o foco nas colheitas do presente. Hoje sou mais senhor do que escravo dos instintos. Luto para vergá-los à minha vontade. O propósito? Ser, como Sêneca ensinou, imperador de mim mesmo.