Tenho séria dificuldade em lidar com pessoas que radicalizam suas opiniões. Tanto faz ser no campo político, religioso ou nos gostos pessoais. A história está repleta de casos assim, e muitos deles acabam em guerra, no sentido literal do termo. Fazer qualquer defesa com fúria, rechaçando pensamentos contrários, nunca acaba bem. Podemos ser portadores de verdades relativas, jamais absolutas. Carrego a impressão de ser similar ao estado de paixão: desconsideramos as alegações discrepantes, mesmo se ancoradas na pura razão. Há um entorpecimento da lógica, valendo um estrito ponto de vista. Se alguém tiver essa inclinação e for detentor de algum tipo de poder, tenderá a se tornar ditador. O fanatismo equivale à cegueira, tal é a patologia que costuma tomar conta da mente. O processo de assimilação ou rejeição de determinadas ideias passa pelo crivo das vivências pessoais. O cérebro é esponjoso e vai se alimentando das convicções colhidas aqui e acolá. Somos, por assim dizer, uma bricolagem, e cada fragmento endossa as pregações.
Nem todos os fanáticos possuem má índole. Tenho amigos que discursam em púlpitos imaginários por acreditarem visceralmente em si próprios. O problema é não quererem ouvir nada dissonante do seu modo de ver e analisar a realidade. É notório o aumento dessa espécie de comportamento nos dias de hoje. A possibilidade de se expor nas redes sociais encoraja posturas drásticas, tantas vezes protegidas pelo anonimato. Vemos seres raivosos, crendo ter em suas mãos cartilhas com novos mandamentos. Devem se considerar ungidos por Deus. O que menos se vê por aí é a busca do tão incensado equilíbrio: bom na teoria, raramente praticado. Se cada um cedesse um pouco e se permitisse analisar os argumentos alheios, testemunharíamos a morte dos extremismos, que ocasionam malefícios das ordens mais variadas. Eu me orgulho de dizer: desse mal não padeço. Porém, foi um processo longo até chegar a essa contenção, pois na minha juventude fui bastante raivoso, ignorando a salutar postura do acolhimento. Quando me defronto com algo discordante, mantenho meus batimentos cardíacos estáveis. Fujo da tentação de bradar, doutrinando quem diverge de mim. Gritar é a pior tentativa de ser ouvido. Só potencializa a crença de que precisamos salvar o restante da humanidade.
São armadilhas, enfim. Cabe parar e aprender a escutar. Hábito, aliás, em franco desuso. O protagonismo de líderes adotando postura beligerante só tem reforçado o equívoco da escolha deste caminho. Por outro lado, seres iluminados como Gandhi, Mandela ou Martin Luther King simbolizam a importância de se esquivar dessa postura belicosa e autocrática. Conseguimos crescer com o reconhecimento de nossos enganos, reavaliando as noções de certo e errado. Necessitamos dessa disponibilidade, sob o risco de nos tornarmos, sem perceber, fascistas bem-intencionados.