Demoramos para perceber, mas uma das grandes tarefas na vida é admitirmos que, a partir de determinado momento, alguns limites se impõem quase sem percebermos. Variam para cada pessoa, mas dificilmente chega-se à velhice sem passar por provações de ordem física ou emocional. O corpo dá sinais de estar “falhando”. Felizmente, com os magníficos recursos que a medicina disponibiliza, alonga-se a chegada desse tempo, quando precisamos vigiar a nossa fisiologia. O estado de observação constante e o reconhecimento do itinerário como parte do processo existencial pode nos ajudar na aceitação da efemeridade humana. Somos matéria perecível, mudando somente a data de validade. Pequenos lapsos de memória, a necessidade do uso de óculos para a leitura, menos resistência para percorrer longas distâncias. Não pretendo imprimir tons de desânimo a esse texto. Simplesmente me dou conta do que é inerente e passível de ser compreendido se alicerçado pela expansão da consciência. Nada disso acontece só com os outros, como pensamos no esplendor da juventude. Essa percepção se dá, no entanto, na sua devida hora, ao se tornarem manifestos os indícios de vulnerabilidade.
O ganho complementar é passarmos a observar com acuidade o que se dá conosco e a valorizar o quão precioso é o mecanismo responsável pelo equilíbrio e pleno usufruto do milagre de estarmos aqui. É comum atravessar os dias sem discernimento, como se tudo durasse para sempre. É a estratégia da natureza para manter-nos alheados no fulgurante período da mocidade. Posteriormente, ocorre a adaptação a uma realidade inédita, dando início à uma época repleta de descobertas. Uma delas é a serenidade, o gosto pelos encontros, com a clara percepção dos aspectos fugazes do que nos cerca. E há também o fato de sermos impulsionados ainda mais pelo entusiasmo, colorindo com alegria cada instância posta diante de nós. É um trabalho permanente, mas carregado de compensações. Vamos deixando de lado certas insignificâncias e substituindo-as pelo essencial ao crescimento interior. Tenho constatado a diminuição de capacidades outrora em perfeito funcionamento, embora de maneira incipiente. Mas sigo em frente sem pestanejar. Olho para meus amigos e analiso como estão lidando com a situação. Escolho os melhores exemplos e tento tatuá-los na minha mente.
Voltei a ler obras budistas e de conotação espiritual. Tenho muitos mestres e a eles dedico fidelidade irrestrita em busca de sabedoria. O novo só surge quando o velho cede seu lugar. Procuro seguir contente em busca de experiências diversas, pois temos à disposição mananciais quase infinitos de escolhas. Acordo pela manhã disposto a extrair do mundo o máximo de beleza. Até quando meu coração repousar ao encontro do vazio ou de algo que por ora desconheço, mas é alimentado pela esperança.