A conversão à direita na mobilidade urbana de Caxias do Sul, trazida à pauta eleitoral pelo prefeito Adiló Didomenico no debate da Gaúcha Serra, sexta-feira passada (13/7), veio para polemizar. Esse discussão é boa, pois estimula o debate essencial sobre transporte coletivo e mobilidade, que estava dormitando entre os assuntos da campanha.
Ao levar o assunto para o debate de sexta, em resposta a pergunta de um ouvinte, e depois em debate direto com a candidata Denise Pessôa (PT) sobre o Plano de Mobilidade, Adiló disse:
– Se tem uma coisa que nós vamos resistir é que não volte mais aquela questão de proibir conversão à direita na Pinheiro (Machado) e na Sinimbu. Eu liberei a conversão à direita na Visconde de Pelotas e na Marechal Floriano (esquinas com Pinheiro Machado) sem fazer nenhum alarde. E tá funcionando e não tá dando problema.
Na foto acima, Adiló e o secretário de Trânsito, Transporte e Mobilidade, Alfonso Willenbring Júnior, em 17 de janeiro de 2021, tempo de pandemia, quando foram à esquina da Pinheiro com a Visconde usando máscara para a liberação da conversão à direita.
Ocorre que o Plano de Mobilidade do município, aprovado em dezembro do ano passado pela Câmara, recomenda e sugere a proibição da conversão à direita por veículos individuais em quatro esquinas: Sinimbu com Garibaldi, Pinheiro com Visconde, Pinheiro com Marechal Floriano e Os Dezoito do Forte com Visconde. Confira no quadro mais abaixo o que diz o Caderno Técnico do Plano de Mobilidade. No mesmo debate, sobre a importância do Plano de Mobilidade, o próprio Adiló atestou:
– Nós temos um marco regulatório daqui pra frente. Nós temos uma diretriz.
No dia da assinatura da ordem de início para a realização do plano, em julho de 2022, o secretário Willenbring destacou a importância do estudo:
– Um legado para Caxias.
O Plano foi desenvolvido pela empresa Urbtec TM, Planejamento, Engenharia e Consultoria, de Curitiba, com orçamento de R$ 2,8 milhões.
O que diz o Plano
Na página 115 do caderno técnico do Plano de Mobilidade, na parte destinada ao “Plano de Melhoria de Oferta”, na Diretriz 3: “Reestruturar o sistema viário para organizar a circulação do município”, está escrito:
* “Melhorar o desempenho do transporte público coletivo nos corredores exclusivos de ônibus – A priorização do sistema de transporte coletivo em uma cidade como Caxias do Sul pode ser fundamental para melhorar a mobilidade urbana, reduzir congestionamentos e promover uma cidade mais sustentável e habitável. O município possui extensa estrutura de faixas exclusivas ao transporte coletivo, porém alguns conflitos ocorrem. Os conflitos se devem a veículos individuais que necessitam realizar conversões sobrepondo-se às faixas exclusivas do transporte coletivo.
Portanto, propõe-se a proibição das conversões (à direita) nas seguintes vias, que possuem faixas destinadas ao transporte coletivo: ruas Sinimbu e Garibaldi; ruas Pinheiro Machado com Visconde de Pelotas e Marechal Floriano; e ruas Os Dezoito do Forte e Visconde de Pelotas.
As alternativas nos locais indicados passam a ser que os veículos realizem três conversões à esquerda para realizar o fluxo desejado, possibilitado pela conversão à direita.”
* Já a Diretriz 8 (página 122) do mesmo Plano de Melhoria de Oferta deixa claro: “Fomentar a redução da emissão de gases poluentes da mobilidade municipal.” Mais veículos individuais nas ruas, quando há estímulo a eles na relação com o transporte coletivo, significa mais emissão de gases poluentes.
"Só trouxe prejuízos", diz Adiló
Para o prefeito Adiló, o Plano de Mobilidade serve para diversas melhorias no trânsito, mas só se aplica se houver benefícios à população:
– O Plano de Mobilidade é uma peça ampla, completa, servindo para diversas intervenções e melhorias no trânsito. Sempre que houver benefícios à população, iremos colocar em prática. No caso da proibição da conversão à direita, só trouxe prejuízos. Por isso, nós somos a favor da conversão à direita, que se mostrou prática e eficiente – disse Adiló à coluna.
Mobilidade por resolver
Não é simples a questão da mobilidade em Caxias. Por isso se diz que o tema da conversão à direita, trazido à pauta eleitoral no debate da Gaúcha Serra, provocou um debate necessário. Isso porque a alternativa do próprio Plano de Mobilidade para não converter à esquerda, que é dar a volta no quarteirão, ou que os veículos individuais realizem “três conversões à esquerda”, não se aplica em Caxias do Sul, pois exige ingressar na Avenida Júlio, onde o fluxo é restrito, em uma única pista.
Se proibir converter à direita é ruim, converter também é, pois atrapalha o transporte coletivo e foge à orientação técnica do Plano de Mobilidade. Remover obstáculos para os ônibus torna mais rápidos os deslocamentos e qualifica o transporte coletivo. Cidades modernas e inteligentes não convertem à direita e não atrapalham o transporte coletivo. É orientação técnica e regra basilar. O tema da mobilidade em Caxias do Sul exige o debate em busca de soluções.
Prioridade é do transporte coletivo
O Plano de Mobilidade tornou-se a Lei 9.076, de dezembro de 2023, aprovada pela Câmara. O texto não deixa dúvida sobre a prioridade ao transporte coletivo. O capítulo “Do Transporte Público” (Artigo 37, I), diz que o transporte público é orientado, entre outras, pela seguinte diretriz: “priorização do transporte público em relação ao transporte individual motorizado”. Já o capítulo III da lei, titulado “Do sistema de Transporte Público Coletivo”, define no Artigo 59: “O transporte público coletivo é a modalidade preferencial de deslocamento motorizado no município.”
A questão ambiental
Ainda tem a questão ambiental. Sob o ponto de vista técnico, da mobilidade, o transporte coletivo deveria reinar soberano. Precisa ter eficiência, o que não há. Até a mobilidade ganhará com transporte coletivo que funciona bem, pois haverá menos veículos individuais nas ruas, e menos tranqueira. Por isso, deveria haver amplos estímulos ao transporte coletivo, o que não há. Com desestímulos, como ter os ônibus a frente cortada por quem converte à direita, haverá mais carros nas ruas e mais emissão de gases poluentes. Prejuízo para o meio ambiente, aquele que todos juram proteger. Na hora do "vamos ver", azar do meio ambiente. Depois tem as consequências.