A cidade está enroscada em seus fios. Isso vem de anos, da negligência em planejar e cuidar da cidade. Foi se agravando sem providências, ia chegar onde chegou, a tal ponto que se tornou necessário parar e organizar a casa. Qualquer semelhança não será mera coincidência. Cotidianamente, temos de cuidar de organizar nossa casa. Se assim não fizermos, em pouco tempo não nos achamos mais. A avalanche de fios não era cuidada. Uma situação emblemática, quem sabe aquela que visivelmente é a mais eloquente, ainda está na esquina da Avenida Júlio com Visconde de Pelotas. Ao passar por lá, veja só como está. Agora, a prefeitura, em conjunto com RGE e operadoras, com acompanhamento do Ministério Público, está cuidando da faxina. Antes, era só descaso, deixa pra lá, vemos depois como é que fica. Estávamos sendo soterrados. Em um só dia de um mutirão recente, foram recolhidas quatro caçambas de fios sem serventia.
A cidade é a casa de todos nós. Temos de organizá-la e cuidá-la, como deve ser com a casa de cada um. Estendendo essa metáfora um tanto óbvia, nossa casa também é nossa vida pessoal, não raro soterrada por uma avalanche de fios, quer dizer, de compromissos, de tarefas, de agendas programadas, de resultados a entregar, de metas a cumprir. Estamos enroscados em fios soltos de todo lado, e ainda temos de correr nessas condições. Não é possível continuar assim. Temos de administrar nossos fios soltos e que nos enroscam, e a estratégia é de cada um: disciplina diária e cotidiana, ou força-tarefa aos finais de semana. Faxina neles!
Ainda no campo das metáforas, os fios que tomaram conta da cidade conduzem tecnologia, além do suporte da distribuição de energia. Ou já não conduzem mais, e ficaram por lá abandonados, como um celular antigo. Tecnologia, internet, mundo digital é tudo muito bom, mas, como se vê nos fios, sufoca e enrosca. Muita atenção, portanto. Os fios que se acumulam ou são deixados à própria sorte nos postes e na cidade são um subproduto, resíduos da tecnologia. É muito bom e sedutor esse novo mundo, mas tem seu preço. Tecnologia pode enroscar de fios nossa vida pessoal, retirar espaço e tempo de outras atividades e programações saudáveis, de encontros que poderiam ser reais, mas se reduzem a encontros virtuais.
Voltando aos postes, os fios poluem o cenário, a contemplação da cidade. Nossos fios pessoais certamente nos afastam de contemplações, sempre importantes. Há cidades, como Gramado e Garibaldi, que tomaram providências ousadas, e simplesmente retiraram os cabos aéreos, tornando-os subterrâneos. É investimento, mas é qualidade de vida. Vamos cuidar da cidade, das ruas, da nossa casa. Vamos cuidar de nós. Vale o investimento. É preciso remover os fios – e as teias mais sutis – que nos enroscam.