Assim que comecei a abicorar as gurias de um modo diferente, com olhos não mais ingênuos, tive meu primeiro choque de realidade na vida: eu não era uma réplica do Alain Delon. Ao invés de acabrunhar-me, a reclamar que as mocinhas não olhavam pra mim, num dia qualquer de 1991 tomei uma decisão que viria a nortear bastante das atitudes que tenho perante a vida: eu precisava me fazer diferente! Algo de especial que os outros guris não tinham, eu precisava acoplar no meu ser. Dos treze aos quinze anos, fiz cinco “doutorados”.
Tomei como norte as reuniões dançantes da época. Primeiro, percebi que poderia fisgar meus sonhos de consumo pelo estômago. Na antiga Lojas Arno, na Rio Branco, fiz um curso de culinária e me tornei o chef da turma. Salgadinhos gordurosos nunca mais.
Em seguida, notei que as gurias não bebiam quase nada. Nem as cervejas quentes dos guris, tampouco cubas com Pepsi e vodca duvidosa. Com uma autorização por escrito dos meus pais fiz um curso de drinks. E assim apresentei as senhoritas de mojito a alexander. Meu ibope dava claros indícios de crescimento.
Chegara a vez dos astros, um assunto que interessa a qualquer mulher do planeta, já aos homens... Alguns não sabem o próprio signo. Estudei astrologia e passei a palestrar nos intervalos da aula, cercado 100% por meninas e com o olhar sinuoso e intrigado de uns colegas até então bem mais cotados do que eu, que àquelas alturas não estavam entendendo nada.
Firme no meu propósito, parti para as mágicas de baralho e com moeda, dessas que a gente faz em churrascos. Lá pelas tantas da noite, as gurias já devidamente alimentadas com um frango à Sevilha e um petit gateau dos deuses; tendo sorvido o drink preferido do Hemingway; ouvido declarações-profissa sobre os astros... Era chegada a hora do sobrenatural. Com o advento das mágicas no meu “currículo” atingi um patamar que nenhum outro guri, pra cá do Trópico de Câncer, havia alcançado.
Todo esse marketing pessoal precisava então ser convertido em “venda”. Pegar na mão da moça era um primeiro quebra gelo elementar. Foi quando estudei quiromancia, a arte de ler as mãos. Era o golpe final, de misericórdia. Depois de tudo, na hora agá, no momento aquele que separa os homens dos guris, a minha escolhida eu abordava para lhe falar sobre o que seus traços nas mãos diziam. A partir daí a gente juntava não só os dedinhos, mas também os beiços em seguida. Um gol de placa.
“Vaca não dá leite, a gente tem que ir lá tirar”, diz o Cortella, sobre o segredo da vida. Não nascemos prontos. Somos um processo em eterna construção. Não contei desse meu passado juvenil para me gabar, mas pra dizer que a palavra mágica da existência é evolução! É imperativo que, por menor que seja o avanço, estejamos hoje melhores do que ontem e piores que amanhã.
E não há investimento mais seguro do que investir em si mesmo. A “rentabilidade” dura uma vida toda. Noves fora, é a gente pela gente, sendo nós mesmos o nosso maior desafio. Uma batalha diária, pessoal e intransferível, de um propósito insofismável, isso de se tornar um alguém melhor a cada dia.