Gosto muito de um cantante uruguaio, Jorge Drexler, que em um dos seus geniais versos, propõe: Cada uno da lo que recibe, y luego recibe lo que da, nada es más simple, no hay otra norma, nada se pierde, todo se transforma.
Todavia, metamorfose ambulante que sou acerca do olhar pro mundo – quando procuro sempre ir me revisando, a me tornar a cada dia que passa a melhor versão de mim – tal premissa trazida pelo hermano Jorge, de que damos aquilo que recebemos, e vice-versa, deixou de fazer o sentido absoluto que me parecia ter. Sempre à cata de leituras alheias pra melhorar a minha percepção do universo, recebi de uma grande amiga um vídeo que propõe uma releitura do tal “amor próprio”, e que tentarei traduzi-lo aqui, com meu tempero, por supuesto.
A começar pelo desamor próprio, não tenho dúvidas: não se ama quem trabalha com aquilo que não gosta; não se ama quem vive uma relação trash e não tem coragem de mudar; quem não cuida da morada da alma, o corpo, não se ama. Quem põe filhos no mundo e não é pai ou mãe, não se ama. Aqueles que não percebem a finitude do tempo e vão desperdiçando-o sem dó nem piedade nem consciência, não se amam; bem como quem vive a reclamar da vida e não faz nada pra mudar, esses apenas existem. Acordam, mas não estão despertos, muito menos espertos, e por isso não se amam. Quem anda à esmo, a viver no triste limbo do quase, à margem da vida, esses não se amam. Aqueles que se deixam consumir pela dúvida, trazendo perdurada no peito, a perfurá-lo a cada dia um tanto, não se amam. Vão morrendo um bocado a cada dia, pois pagam o preço da incerteza, gastando energia com o “e se”, ao invés da certeza de uma resposta, seja qual for. Quem reclama de forma contumaz da cidade em que vive, ou do próprio país, tendo outras 195 nações no mundo, deixa o desamor instalar-se no hall pessoal de sentimentos e, por isso, não se ama.
Isto posto, aspas para um Senhor, que viveu há pouco mais de dois mil anos, que a maioria de vocês por certo já ouviu falar, e que um dia disse: “ame ao próximo como a ti mesmo”.
Se eu tenho um punhado de desamor próprio, como poderei verdadeiramente amar alguém, com todas as premissas intrínsecas ao amor de verdade? Isso fica ainda mais claro quando apontamos o dedo para um defeito alheio: o que nos incomoda no outro está contido na nossa própria dose de desamor.
Por outro lado, vale igualmente colocar: uma vez desenvolvido esse autoamor, saibamos também identificar quem merece ter à disposição o melhor da gente, o que de mais valioso podemos ofertar.
Noves fora, quarenta e duas invernadas depois, num misto do que propuseram Jorge e Jesus, fico com um entendimento híbrido de ambos. Sim, a gente pode devolver o que recebe, mas sobretudo oferece o que tem em essência. E se dentre tais consolidações não existir um amor próprio bem exercitado ou pelo menos em franco desenvolvimento (pois sempre é tempo), é improvável (não impossível) que consigamos entregar ao outro um amor que justifique a dimensão sublime deste que é o mais lindo dos sentimentos.
Jesus Cristo! Ousado e cara de pau que sou, estivesse perto do Senhor na redação dos mandamentos, eu acrescentaria ao primeiro deles: “amar a DEUS e a ti mesmo sobre todas as coisas”.
O cemitério está cheio de sonhadores, que por não se amarem, jamais correram em busca dos seus sonhos. Não sejamos mais um desses mortos vivos ou enterrados sem nunca termos de fato vivido. Nalgum momento da vida (o quanto antes, melhor), urge que vivenciemos o que propõe uma outra canção, que escancara uma necessidade elementar do viver: Eu me amo! Eu me amo... Não posso mais viver sem mim.