“Sua véia, é só não ir”. Esta é a frase que já ouvi e li algumas vezes quando critico a falta de qualidade musical num determinado evento, seja qual for: festinha de criança, barzinho, showzinho na praça, formatura. Infelizmente, está cada vez mais difícil frequentar certos lugares quando se tem algum critério mínimo com relação ao som que irá tocar em determinado ambiente.
Gostar de boa música hoje, infelizmente, parece que virou sinônimo de “velhice” ou até mesmo de “arrogância” ou “preconceito”, dependendo do interlocutor. Na confusão generalizada que se estabeleceu quando o tema é arte e cultura, fatores importantes como talento, habilidade, beleza e criatividade parecem ter perdido espaço para identitarismo, interesses econômicos, massificação e mera farra.
Infelizmente, para se fazer sucesso musical hoje basta se dizer porta-voz do grupo identitário da moda e qualquer desafinação será perdoada. Termos como “open-bar” e “vip copo-cheio” ganham hoje até mais destaque na divulgação de um show musical do que o próprio artista. Certos poderes econômicos injetam milhões e milhões de reais num determinado estilo para propagar sua visão de mundo, criando coisas bizarras como “agronejo” e “funk proibidão”.
Enquanto isso, produtores culturais substituem músicos de verdade – que estudaram e praticaram horas e horas para dominar um instrumento – por playbacks desavergonhados ou um mero pendrive. Um exemplo disso aconteceu no show de certa “cantora”, no último final de semana: ela simplesmente parou de cantar no meio de uma música enquanto o playback rolava solto e a tal artista fazia uma coreografia sensual sem sequer dublar a própria voz. E a galera aplaudindo.
São esses aplausos que me intrigam. Como podem artistas tão ruins com músicas piores ainda atraírem tanto público? Na verdade, a explicação pode ser bem simples: esse pessoal, infelizmente, não conhece outra coisa. Nunca tiveram aulas de música na escola, nunca tiveram acesso a qualquer tipo de iniciação à musicalidade. Não estudaram uma canção enquanto arte, nunca chegaram perto de um instrumento musical ou de uma partitura. Pior: nas rádios, na televisão, no TikTok e em todos os meios a que são expostos consomem o que lhes oferecem, ou seja, pouca qualidade.
Para completar, além das claras limitações sonoras, as letras são uma ofensa à língua portuguesa. Um hit do “fenômeno” do momento traz as seguintes rimas: “Eu começando odonto e você na vet/ A sua camisa jeans na minha caminhonete” e “A boiadeira virou maloqueira”. Sinceramente, diante desses versos, eu fico até sem palavras. Realmente devo estar velha. Melhor ficar em casa mesmo. Mas lamento profundamente que artistas e músicos talentosos, principalmente locais, percam espaço, público e remuneração por causa de um aparente nivelamento por baixo no mercado do entretenimento. Contudo, acredito que há como reverter isso. [continua na próxima coluna]