Dois dos documentários mais interessantes que assisti nos últimos tempos tratam das escavações próximas à pirâmide escalonada de Saqqara, dentro do complexo funerário do faraó Djoser, Terceira Dinastia do Antigo Egito. É emocionante acompanhar os arqueólogos egípcios desvendando, a cada pequeno objeto encontrado e a cada hieróglifo decifrado, os mistérios de uma civilização que existiu a 4 mil anos atrás. No documentário mais recente – Explorando o Desconhecido: A Pirâmide Perdida (2023,Netflix) – a equipe do arqueólogo Mostafa Waziri faz uma descoberta incrível: dentro de um sarcófago, encontram um papiro.
Waziri mal pode conter a emoção enquanto diz à equipe: “Esse papiro vale mais que ouro”. E não restam dúvidas quanto a isso: o conhecimento escrito naquele documento tem valor incalculável para que a humanidade de hoje aprenda um pouco mais com a humanidade como foi antes. Aprender com o passado é o segredo para um futuro mais desenvolvido e mais seguro para todos nós.
Dois textos publicados em GZH nas últimas semanas, a meu ver, são praticamente papiros modernos. São registros feitos por escrito, com quase meio século de existência, com descrições detalhadas de como nosso ecossistema e as bacias hidrográficas são afetados pela ação humana. Primeiro, na coluna Almanaque, de Ricardo Chaves, foi publicada a carta de um leitor, morador do Vale do Taquari, em que ele relata com detalhes a visita de professores e pesquisadores da UFRGS à região no final da década de 1960. O leitor conta que era criança e nunca esqueceu do aviso dos cientistas sobre os perigos que as localidades de Muçum e Roca Sales corriam por causa da proximidade com o rio. Num dos alertas, chegou-se a dizer que as cidades poderiam “desaparecer”, o que praticamente aconteceu na grande enchente de 4 de setembro deste ano.
No último domingo (dia 17), o Caderno Doc resgatou o artigo primoroso de um dos maiores ambientalistas do Brasil, José Lutzenberger (1926-2002), que descreve em detalhes o impacto do desmatamento e da intervenção sem qualquer planejamento nas encostas e nas margens dos rios. No artigo, motivado pela grande enchente de 1974, Lutzenberger registra: “Se as atitudes dessa pobre gente atestam a miséria de sua existência, a repetição das calamidades provocadas pelas enchentes confirma o que há tempo já se podia prever. Se hoje os estragos são imensos e os mortos se contam às centenas, não tardará o dia em que os flagelados e os mortos totalizarão milhões. Somos incapazes de aprender com nossos erros.”
Com textos como esses vindo à tona hoje, décadas depois, tanto conhecimento gravado para a posteridade, precisamos entender de uma vez por todas o valor incalculável dessas vozes do passado para agirmos no presente e termos algum tipo de futuro garantido. Respeitar os registros e os testemunhos de outrora é a única forma de nos prepararmos para o que virá ali adiante. Tudo isso vale mais que ouro.