Dias atrás, eu tomava um cafezinho num espaço modernoso de Caxias do Sul. Sentados à mesa ao lado, havia um pai e uma filhinha – que não deveria ter mais de seis anos – vestida com o uniforme de uma escola bem tradicional da cidade. O pai de rosto colado no celular com aquele ar de enfado; a menininha de olhos curiosos admirava o ambiente em silêncio enquanto tomava um chocolate quente. De vez em quando, ela buscava o olhar do pai, imóvel e absorto sem sequer trocar uma palavra com a guriazinha.
Juro que tentei não julgar aquele pai: talvez estivesse com problemas no trabalho (e que adulto hoje não tem problemas no trabalho?), talvez estivesse tentando resolver alguma questão importante que o impedia de dar atenção à filha. Contudo, foram longos 30 minutos daquele jeito. Não pude deixar de sentir pena da garotinha: o que será que era tão importante naquele telefone que o impedia de reconhecer a presença da menina ali do seu lado esperando uma migalhinha de atenção?
Até penso que as crianças tendem a lidar melhor com a negligência de seus progenitores. Contudo, na adolescência, a dor de quem foi totalmente ignorado e a falta de diálogo se transformam numa fonte inesgotável de revolta, de mágoa e de rancor. O espaço que a família deixou vago na vida daquela criança acaba sendo ocupado por outras coisas quando um adolescente começa a se descobrir e a descobrir o mundo. Se esse jovem tiver sorte, o vazio que o pai e a mãe deixaram de preencher com afeto, com reconhecimento, com proteção poderá até ser preenchido com algo positivo. Muitas vezes, uma boa escola, um grupo de escoteiros, organizações como Interact e Leo Clube, grupos de jovens de diferentes religiões, um primeiro emprego numa empresa com bons chefes, um clube esportivo ou academia podem se transformar na família participativa, presente e interessada no bem-estar do adolescente cuja própria família o negligenciou.
Contudo, as armadilhas e os perigos nessa fase da vida são inúmeros, e isso explica muitas tragédias que infelizmente envolvem menores de idade. As redes sociais e o mundo subterrâneo da Internet estão ocupando espaços nas mentes e nos corações de meninos e de meninas no mundo inteiro com coisas horrendas. O caso recente do garoto de 14 anos apreendido com materiais de grupos neonazistas em Maquiné, aqui no nosso Estado, é uma prova de que muitos pais sequer fazem ideia do que ocupa o tempo, o interesse e a atenção de seus filhos. Por mais humildes e ocupados que fossem, como podem não ter ao menos questionado o que ele andava fazendo tanto tempo na internet e com todos aqueles símbolos nazistas e fascistas em seu quarto, além de facas, canivetes e armas de fogo? Como tudo isso passou despercebido por aquela família dentro daquele lar?
Mas aí é que está: provavelmente, lá era só uma residência, não havia família, nem lar.