O espetáculo proporcionado pelos atletas de todo o mundo a cada quatro anos sempre traz à tona o debate sobre o esporte no Brasil. Estamos, ou não, melhorando? Somos, ou um dia seremos, um país relevante no mundo desportivo? Compreendemos, afinal, a dimensão dessa discussão, ou pensamos apenas em ganhar?
Muitas questões presentes, e o fato de tratarmos delas apenas a cada quatro anos já dá um indício de que, sim, ainda temos um longo caminho a percorrer. O primeiro é que não se pode pensar ou debater o assunto apenas a cada olimpíada. Se realmente queremos nos tornar mais relevantes no esporte, o investimento e a mentalidade acerca do tema têm que estar presentes no dia a dia dos brasileiros.
Aliás, aqui cabe reforçar a questão: realmente queremos nos tornar mais relevantes no esporte olímpico? O povo brasileiro dá importância para isso? Sinceramente, creio que aquela máxima muito vista no futebol, de que nós gostamos mesmo é de ganhar, e não do jogo em si, se aplica também (ou até mais) nos esportes olímpicos. E isso acaba provocando análises muito simplistas sobre que é apresentado pelos nossos atletas, e não colabora para a criação de uma cultura esportiva mais sólida.
Quer exemplos? Agora somos fãs da ginástica, impressionados pelos resultados de um fenômeno como a Rebeca Andrade. Mas, no passado, já fomos impactados por gênios como Adhemar Ferreira da Silva, Cesar Cielo, Oscar e Gustavo Kuerten. E nem por isso nos tornamos o país do salto triplo, natação, basquete ou tênis, porque foram apenas sucessos pontuais, de atletas fabulosos, e muito pouco de uma política consistente de esporte.
Reconheço que, no caso da Rebeca e da ginástica, há um trabalho de base por trás, e que ela é mais do que um fenômeno isolado. Mas para chegarmos a ter uma Rebeca, grandes ginastas foram rotulados como decepcionantes, fracassados, amarelões e toda sorte de absurdos, pelo simples fato de não terem sido medalhistas de ouro. A caminhada de um atleta até uma olimpíada é pouco entendida pelo brasileiro médio, e a velha frase atribuída a Ayrton Senna, de que "o segundo colocado nada mais é do que o primeiro dos perdedores", segue ditando a nossa visão sobre o esporte.
Ainda no assunto ginástica, não tenho dúvida de que a medalha de bronze conquistada na competição por equipes é mais importante do que o ouro ganho por Rebeca, pois simboliza que o país tem muito mais do que somente uma atleta fenomenal. Temos ali um trabalho consistente em um esporte complexo, e que se seguir nesta trilha, fará com que tenhamos chance de nos manter no topo, mesmo no dia que a Rebeca se aposentar. É preciso entender isso, e criar essa mentalidade na população.
Assim como é preciso dizer que um resultado como o do Hugo Calderano, que ficou em quarto lugar no tênis de mesa, precisa ser valorizado (há vários outros exemplos, mas este ficou muito evidente para mim). Quantas pessoas que praticam tênis de mesa você conhece? Quantas empresas apoiam este esporte no Brasil? Um atleta que se desenvolve em um ambiente inóspito como esse e consegue ser o primeiro não asiático a chegar na semifinal de uma olimpíada obteve um feito, certamente, maior que o de muitos medalhistas, e rotular a participação dele como derrota ou fracasso é uma tremenda injustiça.
Além da questão da mentalidade, é evidente que também temos limitações financeiras difíceis de superar. Fazer esporte de alto nível não é barato, e não é coincidência o fato de que os dez primeiros ocupantes do quadro de medalhas de uma olimpíada são, invariavelmente, potências geopolíticas ou países com alto nível de desenvolvimento econômico e social, o que não é o caso do Brasil. No dia em que tivermos educação melhor, saneamento básico universalizado e erradicação da fome, ficará mais fácil implantar uma política de formação de atletas.
Dito isto, e para fechar com um pouco de otimismo, vejo também coisas positivas. Reconheço que, apesar dos pesares e dos valores ainda insuficientes, conseguimos ao longo das últimas décadas melhorar no financiamento ao esporte, o que se traduz em desempenhos muito acima do que tínhamos em um passado mais distante. De três medalhas conquistadas em Barcelona-92, temos um crescimento consistente nos jogos subsequentes, colocando-nos em uma média entre 15 e 20 medalhas nas edições mais recentes e na atual.
Além disso, há trabalhos sólidos em modalidades como vôlei, judô e a já citada ginástica, permitindo que esses esportes sejam competitivos muito além dos fenômenos individuais. Mas podemos ir muito além, e penso em quantas Rebecas não temos por aí? Com um pouco mais de investimento no esporte, melhora na condição das pessoas e mudança de mentalidade, valorizando o esporte e o papel educacional e social dele, temos tudo para vê-las surgir.