A sequência de eventos climáticos extremos que atingiu o Rio Grande do Sul nos últimos meses tem vários aspectos que precisam ser analisados. Muito além do lamento pelas mortes e foco na recuperação dos danos, o que aconteceu tem que servir para iniciar uma ampla mudança, adaptada a uma nova realidade. E isso passa por autoridades e cidadãos.
É verdade que, ao longo da história, o RS teve outras secas, enchentes e temporais, e que fenômenos como La Niña e El Niño, que provocam situações como essas, são conhecidos há tempos. Mas a sequência absurda e a intensidade dessas ocorrências não é o que se via antes. As estatísticas disponíveis mostram isso, apontando 2023 como o ano mais quente da história, potencializando as consequências e provocando o que vimos recentemente.
Partindo deste inevitável pressuposto de que o clima mudou, e que temos grandes chances de continuar enfrentando este tipo de situação, os comportamentos também precisam mudar. A criação de uma cultura de alerta sobre situações climáticas e o respeito a essas informações é uma necessidade urgente. Modelos vistos em países mais adaptados a conviver com fenômenos como furacões, terremotos e vulcões podem ser úteis, e é preciso estudar estas alternativas e adaptar à nossa realidade.
Algumas iniciativas já existem no RS, mas convenhamos que ainda são muito tímidas. O envio de SMS alertando sobre chance de tempestade é útil, mas não dá para ficar só nisso. Ferramentas de comunicação igualmente simples, porém mais modernas e próximas à população, como o WhatsApp, precisam ser usadas. Uma distribuição de informações da Defesa Civil nesta plataforma, por exemplo, sem dúvida seria mais efetiva, para citar só uma possibilidade.
Na verdade, as autoridades precisam criar esquemas muito mais eficientes para atendimento a emergências. Gabinetes preventivos, centros de monitoramento e meteorologia modernos, esquemas de mobilização de recursos humanos e reserva técnica de materiais é o mínimo que deve ser pensado. A constrangedora escassez de motosserras na recente crise vivida em Porto Alegre é só um exemplo de como é preciso evoluir neste ponto. E como estão Caxias do Sul e cidades da Serra neste campo? Sinceramente, não acredito que estejam mais preparadas (mal preparadas, no caso) do que se mostrou a Capital.
É urgente que os poderes públicos também cobrem de concessionárias de luz, água e internet planos de contingência mais condizentes com a nova realidade, pois como já dissemos, o futuro traz a tendência de repetição de ocorrências extremas. Além disso, explicações rápidas e um pouco mais de humanização no atendimento, mostrando o mínimo de compreensão aos dramas individuais, são fundamentais.
Por fim, a população precisa ser treinada e orientada. Na última segunda-feira à noite circulou em redes sociais um vídeo do governador Eduardo Leite e autoridades falando sobre o risco do temporal que se aproximava. Sem dúvida foi uma boa iniciativa, mas o que fazer a partir disso? É preciso deixar claro às pessoas que este tipo de alerta deve ser levado a sério sempre, além de oferecer informação sobre como agir caso as previsões negativas se confirmem.
Finalmente, é necessário admitir que já estamos vivendo um momento em que as mudanças climáticas são inequívocas. Não se trata mais de imaginar o que pode acontecer no futuro ou fazer apenas projeções estatísticas. Os efeitos estão aí presentes, todas as semanas, visíveis aos nossos olhos, e não há mais como minimizar ou negar que algo diferente está ocorrendo. Por isso a necessidade de mudar, desde já, planos e comportamentos.