Eu sou filha da dona Terezinha. Minha mãe tem todos os dedos da mão e do pé verdes. O que ela planta, dá. Acabou de colher grão de bico, melancia, mogango, milho, moranga. Até na pracinha do bairro ela plantou. Cansada de ver o mato crescer convidou uma penca de pessoas para um sábado pela manhã irmos plantar. No frigir dos ovos, estávamos apenas em quatro pessoas, mas valeu a pena. Plantamos tomate cereja, girassóis, um pé de ameixa, dois de laranja, um de araticum, uma três marias e muitas, muitas flores. Tudo sob a batuta da dona Tereza, uma senhorinha magrinha, pequena e muito forte. As plantas pegaram, cresceram e além de colorir o espaço têm muito tomate cereja para ser colhido.
Conto isso porque eu nunca me imaginei tendo algum dedo verde. Nas poucas vezes que mexi com as verdinhas, tinha mais vocação para matá-las do que para fazê-las viver. Uma tristeza. Então casei, construímos nossa casa e eu ganhei minha primeira planta de aniversário: uma jiboia em uma kokedama. Um bebê de jiboia. Pequena e verde. Com o passar do tempo ela foi crescendo, crescendo, crescendo e eu me sentindo angustiada de ela estar vivendo naquela amarração inspirada numa técnica japonesa que apesar de muito bonita, me parecia asfixiante. Criei coragem. Acessei a internet, li tudo sobre como criar jiboias, como preparar o terreno e lá fui eu, cortar a kokedama e planta-la num vaso maior. Adivinhem? Passados alguns anos, a jiboia está com quase três metros de comprimento. Teve de sair de dentro de casa e ganhar o contorno dos galhos da glicínia. De lá para cá, já tenho mais de quatro espécies de jiboias diferentes e mais muitos asplênios, crótons, samambaias, orquídeas, cordilines, bromélias (tem que cuidar com o mosquito da dengue nelas), confetes, corações emaranhados, avencas, fitônias, calatéias, singônios, marantas-cascavel e zebrada, lírios da paz, antúrios, gerânios, begônias e diversas suculentas e cactos. Na horta, temperos, pimentões, beringelas, batata doce, cebola, manjericão de folha miúda, larga e roxo, tomate cereja e coentro. Tudo misturado, afinal o jardim também para vai para o prato quando se conhece melhor as panc e as plantas comestíveis. Finalmente descobri que também tinha o dedo verde. É claro que meu passado me condena. Já matei várias rosas do deserto, orquídeas e gloxínias. Mas aos poucos, com paciência, estudo e dedicação, vou plantando, vendo-as crescer e fazendo mudinhas para os amigos. Um mundo verde é um mundo mais fresco, com mais cores e sombra.
Pode parecer estranho, mas cuidar de plantas tem me ensinado a cuidar de pessoas. É preciso conhecer o substrato onde vivemos, se está rico de nutrientes ou escasso de afeto e sonhos. Quais tipos de pragas silenciosas ameaçam as folhas e sugam a seiva do sujeito já tão desvitalizado, pois assim como as plantas, pessoas precisam ser cultivadas com amor e observação. E algo muito importante que a natureza me ensinou, é que os vasos precisam estar sempre na altura do braço, seja para ver se estão com falta de água ou para acolher a pessoa, quando a dor for grande demais.