Uma das doenças que mais aumentaram em incidência nos últimos anos em todo o mundo, a obesidade também atinge índices cada vez mais altos em Passo Fundo, no norte gaúcho.
Conforme dados do Sistema Vigilância Alimentar e Nutricional (Sisvan), a cidade registra 8.623 casos de obesidade graus 1, 2 e 3 em adultos entre 20 e 60 anos até o começo de agosto de 2024.
Em seis meses, o índice equivale a 77% do total de 2023, quando foram registradas 11.112 pessoas obesas ao longo de todo o ano, e supera todo o ano de 2022, quando havia 8.216 casos de obesidade na cidade. Em 2021, o número foi de 3.314.
Os graus 1, 2 e 3 representam o índice de massa corporal (IMC) do corpo humano. É obesa a pessoa com IMC acima de 30. No grau 1 fica quem tem IMC de 30 a 34,99. Já os graus 2 e 3 ficam na faixa de 35 a 39,99 e acima de 40, respectivamente.
Passo Fundo também chama a atenção pelo número de pessoas com sobrepeso (IMC acima de 25): são 6.614. Os dados ficam acima de cidades como Caxias do Sul, por exemplo, onde há 1.739 casos de obesidade grau 1, 2 e 3 e 994 pessoas com sobrepeso.
Ainda assim, a cidade do norte gaúcho fica atrás de Novo Hamburgo, que tem a mesma média populacional de 215 mil habitantes e 355% mais pessoas obesas que Passo Fundo, com quase 39,3 mil casos.
— A obesidade é complexa porque atinge cada corpo de uma forma diferente. E porque ela é considerada uma doença? Porque o cérebro da pessoa perde a capacidade de regular a gordura depois que ela atinge um certo nível de gordura corporal — explica o médico especialista em cirurgia do aparelho digestivo, Geisson Beck Hahn.
A doença crônica pode acarretar em problemas de saúde como insuficiência cardíaca, infarto, Acidente Vascular Cerebral (AVC) e até 14 tipos de câncer. Entre os seus fatores, não é só causada com a má alimentação e a falta de exercício físico, mas também pela genética, estresse e falta de sono.
Cada vez mais comum em crianças
O problema é ainda mais preocupante quando se trata de crianças. Conforme o Atlas Mundial da Obesidade de 2024, a doença deve atingir metade das crianças e adolescentes do Brasil em 2035.
Em Passo Fundo, há 627 casos de obesidade em menores de cinco a 10 anos entre janeiro e julho, sendo 237 sinalizados como obesidade grave. Outras 614 crianças foram classificadas com sobrepeso, conforme dados do Sisvan.
Segundo Geisson, um dos pontos principais do tratamento da obesidade é conscientizar a família de que há a necessidade de um olhar mais atento sobre os hábitos e a rotina daquele jovem.
— É necessário ter uma conversa saudável com essa criança, adicionar exercício físico no dia a dia, fazer um acompanhamento com psicólogo para verificar possíveis estresses, entre outras ações — aponta o médico.
Ambulatório específico
A preocupação com a obesidade em Passo Fundo abriu espaço para a instalação do Ambulatório Qualidade de Vida, que ajuda pessoas a perderem peso em busca de uma vida mais saudável. Hoje, mais de 200 pessoas têm acompanhamento no local e só em 2024 já foram realizados 1,2 mil atendimentos.
Para uma consulta, o paciente precisa ser encaminhado para o atendimento especializado após buscar a rede básica de saúde, que identifica a necessidade de acordo com cada pessoa.
O local oferece apoio com médico, nutricionista, psicólogo e fisioterapeuta — e, em alguns casos, direciona para a realização de cirurgia bariátrica.
— O foco é fazer com que a pessoa tenha uma rotina melhor, que consiga manter uma alimentação saudável, o que é ainda mais importante do que a perda de peso, além de fazer com que esse paciente tenha uma saúde, no geral, controlada — disse a nutricionista do ambulatório, Gláucia Boeno dos Santos.
Quem passou pelo ambulatório e teve acesso à cirurgia bariátrica através do Sistema Único de Saúde (SUS) foi Vanessa Ribeiro de Brito, 25 anos. Sem nenhum outro tipo de doença, ela chegou a pesar 153kg.
A cirurgia foi em 28 de junho após cinco anos aguardando na fila do SUS. Ao todo, ela já perdeu 30kg entre a preparação para o procedimento e o pós-operatório.
— Eu nasci uma criança já um pouco obesa e durante toda a minha adolescência fui assim. Sofri bastante quando estava na escola. Daqui pra frente tem que ter muito comprometimento para seguir me cuidando. É uma mudança para a vida inteira, mas é uma vida nova — disse.
Atualmente 60 pessoas têm acompanhamento pré-operatório para cirurgia bariátrica no Ambulatório Qualidade de Vida. Em 2024, já foram realizados 15 procedimentos pelo Sistema Único de Saúde (SUS).
Mas antes de ir para a cirurgia, há um processo para que os pacientes encontrem maneiras de manter as mudanças e o novo estilo de vida. Por isso, psicólogos trabalham para dialogar sobre as expectativas de cada paciente e apoiá-los a enfrentar os desafios.
— Vários pacientes apresentam quadros de depressão e ansiedade, além de problemas com a autoestima. Muitas vezes, a alimentação se torna uma maneira de lidar com essas angústias. Por isso o acompanhamento psicológico é fundamental para manejar essas questões que muitas vezes desencadeiam os transtornos alimentares que levam à obesidade — afirmou a psicóloga do ambulatório, Patrícia Mezzomo.