Em Lagoa Vermelha, município de 27,6 mil habitantes do norte gaúcho, churrasco é coisa séria. Desde 2021, a cidade é oficialmente a Capital Nacional do Churrasco e, para manter o status e a tradição, desenvolve projetos e trabalhos desde o público infantil até bovinos de corte. A iguaria é lembrada nesta quarta-feira (24), quando se comemora o Dia do Churrasco.
O churrasco tradicional de Lagoa Vermelha é com espeto de madeira, feito na brasa e com cortes especiais, como o tradicional "chapéu de bispo", e linguiça campeira. Mas, para que a comida chegue até o prato dos apreciadores, é fundamental ter assadores que saibam como fazer o processo, desde o corte da carne até o tempo certo de assar.
Esse quesito não deve ser um problema para o futuro. No município, existe um projeto que leva os Centros de Tradição Gaúcha (CTGs) às escolas e as escolas aos CTGs. A ideia é mostrar e ensinar sobre a cultura gaúcha. Nesses momentos, o churrasco de Lagoa Vermelha é pauta fundamental.
Na terça-feira (23), alunos da Escola Cívico Militar Diógenes Euclides da Cunha foram até o Parque de Rodeios da cidade, onde aprenderam sobre a carne, como são encontrados e feitos os cortes tradicionais e especiais. A linguiça campeira, claro, também foi assunto na aula. O assador e vice-patrão do CTG Alexandre Pato, Alessandro Muliterno, ensinou todos os detalhes sobre o processo do churrasco, do corte à quantidade ideal de sal.
— Eu aprendi como colocar o espeto na carne, o que eles colocam na linguiça campeira e sobre carnes especiais — conta Marjorie Vasconcellos, 10 anos.
— É um jeito diferente de outras cidades. Também (aprendi) que eles tiram o osso para a carne não ficar muito grossa e reaproveitam colocando na linguiça campeira — completou Igor dos Santos, 10 anos.
Como consequência, os pequenos assadores levam o conhecimento sobre o churrasco de Lagoa Vermelha para casa, onde apresentam a tradição à família e, assim, perpetuam as técnicas da cidade conhecida pela melhor carne assada do Brasil. A fama é tamanha que os assadores já viajaram até para o Acre para servir o churrasco gaúcho, em julho de 2023.
Das criações de gado aos espetos
Ter uma carne de qualidade é fundamental para que o churrasco de Lagoa Vermelha seja destaque no Rio Grande do Sul e no Brasil. Por isso, nas criações de gado diferentes regras e parâmetros são seguidos afim de prover bem-estar ao animal e, por consequência, um produto final nível superior.
Fabrício Pacheco Fernandes é agropecuarista e trabalha com uma média de 200 animais em sua propriedade. Segundo ele, as práticas têm influência direta na carne produzida em Lagoa Vermelha.
— Tem vários detalhes que a gente tenta conseguir melhorar a qualidade da carne. Desde a criação, engorda, processo de abate e toda a cadeia em si, buscamos fazer algo diferente sempre por uma qualidade melhor — disse o criador.
Com a mesma filosofia, o produtor rural Paulo Martins Pinto tem cerca de 300 cabeças de gado da raça Angus em sua propriedade. Ali, desde a época de abate dos animais, com no máximo dois anos de idade, até a forma como são criados no campo têm reflexo no produto final.
— A questão seria o pasto. No inverno a gente trabalha com aveia e azevém, e no verão com tifton e campo nativo. Isso traz uma qualidade diferenciada para a carne. Os produtores que criam, fazem recria e engorda, tudo isso vai somando para ter uma melhor qualidade — relata o produtor.
Resultados
O trabalho já abre espaço para resultados. No final de 2023, Paulo, Fabrício e outros 22 criadores receberam o certificado de Sustentabilidade de Sistemas de Agricultura Alimentar (SAFA, na sigla em inglês), desenvolvido pela Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) em parceria com o Sebrae.
A avaliação verifica a forma que os produtores gerem as criações, o bem-estar animal e como é a relação com a sustentabilidade em relação ao meio ambiente.
— Vieram empresas que fizeram a auditoria em todas as propriedades dos participantes do grupo, onde foi vista a questão de manejo da terra, cuidado com o meio ambiente e Áreas de Preservação Permanente (APPs). Tudo isso foi altamente auditado e com grande êxito nós conseguimos nota máxima nesse quesito de sustentabilidade — relata Fabrício.
Depois da certificação, o trabalho não parou. Os criadores avançam em certificações e auditorias do Sebrae para conseguir um selo de qualidade para carne. A marca permitirá que o produto de Lagoa Vermelha seja vendido para o mercado nacional com comprovação de alta qualidade.
— É uma questão de valorização dos produtores. Hoje produzimos um gado de qualidade que é característico da nossa região. O selo vai acrescentar muito para a comercialização da nossa carne e a valorização do nosso município como Capital Nacional do Churrasco — define Alisson Mondadori, presidente do Sindicato Rural.
Assador profissional, Valdir Alves da Silva, que já viajou para o Acre para apresentar o churrasco de Lagoa Vermelha, garante que o churrasco da cidade realmente é diferenciado.
— É diferente. A gordura é diferente, a consistência, o marmoreio, a própria cor da carne, né? A carne fica um pouco mais avermelhada justamente por causa do tipo do gado que é engordado e criado a pasto aqui — pontua.