Uma discussão séria sobre diminuir a jornada de trabalho semanal sem redução de salário no Brasil precisa ser precedida por um debate consequente sobre os altos custos para empregar. Os encargos trabalhistas no país são dos mais altos no mundo. Sem enfrentar este ponto, qualquer proposição para diminuir o número de horas em tarefas laborais é irresponsável e inviável, mesmo que tenha um fundo meritório e apelo popular.
O tema reacendeu nos últimos dias com a iniciativa da deputada federal Érika Hilton (PSOL-SP) de apresentar uma proposta de emenda à Constituição (PEC) para acabar com a escala 6x1, de seis dias de trabalho e um de descanso. Seria substituída pelo esquema 4x3. O número máximo de horas semanais cairia de 44 para 36, sem prejuízo ao vencimento do funcionário. A intenção é dar aos trabalhadores mais tempo para o lazer e a convivência com a família, com reflexos na qualidade de vida.
É básico primeiro reduzir o custo de empregar e ter uma educação de qualidade que permita um salto na produtividade
A realidade, porém, indica que a finalidade defensável traria efeitos colaterais graves para as empresas, a economia e os trabalhadores. Para compensar a redução de dias e horas dos trabalhadores contratados, o empregador teria de admitir mais pessoas, acrescendo despesas para produzir o mesmo bem ou serviço. O resultado seria que a empresa teria um grande aumento de custos, com risco à continuidade do negócio, ou teria de repassar esses gastos adicionais para o cliente. A consequência, nos dois casos, é temerária.
Especialista em relações do trabalho, o sociólogo José Pastore, professor da Universidade de São Paulo (USP), apresentou neste ano um estudo detalhando item por item o peso dos encargos no país. Pegou como exemplo um industriário. A soma dos impostos, contribuições sociais, gastos com o período em que o colaborador não está trabalhando, 13º salário e outros desembolsos obrigatórios chega a 103% do vencimento pago ao funcionário. Trata-se de uma excrecência que também fomenta a informalidade. Um levantamento do jornal O Estado de S. Paulo também comparou o Brasil com 42 nações da OCDE, conhecida como “Clube dos Ricos”. Em termos de impostos sobre salários e contribuições à seguridade social, as empresas instaladas no país, com uma carga de 25,8% nestes itens, pagam menos apenas do que na França (26,6%). Nos EUA, o percentual fica em 7,6%.
Outro aspecto essencial para uma discussão sóbria é o da produtividade do trabalho. Diz respeito à capacidade de finalizar mais tarefas em menos tempo, sem prejuízo à qualidade. Conforme a Fundação Getulio Vargas (FGV), o Brasil está estagnado neste quesito há ao menos três décadas. A produtividade do brasileiro equivale a um quarto do norte-americano, por exemplo. Nesta conta, entram escolaridade, qualificação e o nível tecnológico empregado nas atividades. É o que permite alguns países pensar em implementar de forma sustentável a ideia de redução de jornada. Não é o caso do Brasil, a não ser em setores específicos. Deve ser tratado caso a caso, portanto, em negociações coletivas. Para ser um tema que avance de forma mais ampla por aqui, é básico primeiro reduzir o custo de empregar e ter uma educação de qualidade que permita um salto na produtividade. Sem essas pré-condições, é tema que pode gerar barulho nas redes sociais, mas tende a não prosperar.