Foi apenas um jogo de cena para tentar confundir e manter a farra. A Câmara dos Deputados aprovou na semana passada novas regras para o pagamento de emendas que, em tese, deveriam dar mais transparência aos repasses, em atendimento à determinação do Supremo Tribunal Federal (STF). Em agosto, o ministro Flavio Dino suspendeu o pagamento das modalidades impositivas até o estabelecimento de critérios que garantissem a devida clareza aos repasses, com informações sobre o parlamentar que apadrinhou a transferência e o uso do recurso, por exemplo. O texto votado melhora alguns pontos, mas em regra mantém a falta de nitidez e rastreabilidade sobre indicação e aplicação dos recursos públicos, além de assegurar mais dinheiro para os legisladores distribuírem no próximo ano.
Será interessante verificar se o ministro Dino vai considerar as mudanças suficientes. O projeto de lei vai agora para o Senado
Entidades que costumam denunciar o mau uso de verbas públicas, como Transparência Brasil, a Associação Contas Abertas e a Transparência Internacional, divulgaram nota mostrando que as alterações contêm falhas e omissões e não acolhem as exigências do STF. O curioso é que o autor da proposta, o deputado Rubens Pereira Júnior (PT-MA), é próximo de Dino e um dos líderes do governo na Casa e o teor seria o resultado de um acerto entre os poderes. O Planalto, convém lembrar, reclama reiteradamente do avanço do Congresso sobre o orçamento, assegurando ano a ano cada vez mais recursos por meio de emendas. Será interessante verificar se o ministro Dino vai considerar as mudanças suficientes. O projeto de lei vai agora para o Senado.
Pelas alterações sugeridas, nas emendas Pix, que são individuais e impositivas, os autores precisarão apontar a finalidade e o montante destinado, com preferência por obras inacabadas. Mas permanece a falta de exigência de convênio para a execução do projeto beneficiado ou cronograma. Não há garantia de que o recurso será empregado no propósito descrito.
Nas emendas de bancada, também de execução obrigatória, foi ampliado o conceito de “projetos estruturantes”, prioridade para alocação dos recursos, e os deputados de um Estado poderão enviar verbas para outras unidades da federação. Conforme as entidades, permanecerá a falta de uma relação mínima e padronizada de informações que deveriam constar nas atas das reuniões de bancada para se assegurar a transparência e a rastreabilidade.
Nas emendas de comissão, consideradas as sucessoras do orçamento secreto, julgado inconstitucional pelo STF, a desfaçatez se revela por completo. Permanece inexistindo obrigatoriedade de apontar o parlamentar que indicou o repasse. Colide tanto com a determinação de Dino como com a decisão da Corte que apontou a ilegalidade das emendas de relator, popularizadas como orçamento secreto e pródigas em suspeitas de corrupção.
Os recursos para as emendas continuarão se avolumando a cada exercício. Terão um aumento real de 2,5%. Vão sempre superar a inflação. Para completar, além dos R$ 39 bilhões assegurados no orçamento de 2025 para as modalidades impositivas, as de comissão devem ganhar mais R$ 11,5 bilhões. Em meio à necessidade de um forte ajuste fiscal, a equipe econômica que se vire para encontrar onde cortar para atender os parlamentares.