Uma das características de tragédias climáticas como enchentes e enxurradas é vitimar principalmente a população mais carente. É quem, sem outra alternativa, tem de viver em residências precárias e em áreas de risco. Nos primeiros dias após a cheia de maio, o Rio Grande do Sul chegou a ter mais de 78 mil desabrigados amparados em locais temporários. Gente que teve a casa destruída ou tomada pelas águas e não tinha onde se alojar. Mais de seis meses depois, ainda são quase 1,7 mil afetados vivendo em abrigos e nos dois Centros Humanitários de Acolhimento (CHAs), em Canoas e Porto Alegre.
Mais de seis meses depois da cheia, ainda são quase 1,7 mil afetados vivendo em abrigos e nos dois Centros Humanitários de Acolhimento
Por mais que exista o esforço para dar um mínimo de conforto e estrutura aos que seguem sem ter um lugar seu para voltar, a dignidade só será conquistada com uma moradia definitiva. É preciso imprimir maior velocidade aos programas voltados a garantir um teto a esses gaúchos. Não são números. São pessoas com histórias de vida, aflições, sonhos e esperança de dias melhores que seguem à espera do cumprimento das promessas dos governos federal e estadual.
O Executivo federal, pelas palavras do próprio presidente Luiz Inácio Lula da Silva, se comprometeu a doar casa a todas as famílias enquadradas nas faixas 1 e 2 do Minha Casa Minha Vida que perderam o lar na enchente. A projeção era de mais de 17 mil unidades habitacionais construídas ou doadas pela modalidade de compra assistida. Até o início deste mês, conforme o Painel da Reconstrução da RBS, somente cerca de 400 imóveis foram entregues.
Sabe-se que a edificação de novas moradias é demorada pela necessidade de vencer as etapas burocráticas, assegurar infraestrutura de acesso, energia e água e pelo próprio tempo necessário para a construção das unidades. Mas o programa de compra assistida, em que os beneficiários escolhem um imóvel cadastrado pronto no valor de até R$ 200 mil, já poderia estar mais adiantado. A primeira família do Estado beneficiada recebeu as chaves no último dia 31, quase três meses após o início das inscrições. Seria conveniente se a iniciativa, que já contemplou um pequeno número de pessoas em outras cidades, ganhasse mais tração nas próximas semanas. O Piratini, por seu turno, entregou 212 moradias temporárias de 500 prometidas e projeta ter prontas residências definitivas, em um total de 648 unidades, a partir do próximo ano.
Das 1,7 mil pessoas abrigadas em 21 cidades do Estado, conforme balanço da Secretaria Estadual de Desenvolvimento Social, mais de 800 estão nos dois CHAs, em Canoas e Porto Alegre, montados pelo Estado e geridos pela Agência da Organização das Nações Unidas (ONU) para migração (OIM). A ajuda especializada é de grande importância para uma melhor estadia transitória. São locais com espaços como áreas infantis, lavanderia coletiva, ambientes multiúso, atendimento médico e segurança, entre outros serviços de facilidades. Com a chegada do período mais quente, no entanto, surgem queixas da falta de janelas e aparelhos de ventilação, o que gera desconforto térmico. O governo gaúcho promete melhorias a partir da próxima semana. É o mínimo para amenizar o sofrimento de centenas de pessoas que vivem a angústia de uma espera sem prazo certo para acabar. São trabalhadores, idosos e crianças que não podem ser esquecidos pelo poder público.