É admirável constatar, quase dois meses após os gaúchos começarem a enfrentar a maior tragédia climática do Estado, o prosseguimento de grandes mobilizações de cidadania para amparar os mais necessitados. Uma nova demonstração de desprendimento foi vista no domingo, nos bairros Vila Farrapos e Humaitá, na zona norte da Capital, a região mais afetada pelos alagamentos na cidade. Dois mil voluntários se uniram para limpar 200 residências tomadas pelas águas e pela lama, algumas delas por semanas.
Os voluntários escreveram um capítulo à parte na tragédia climática que se abateu sobre o Rio Grande do Sul
Os depoimentos dos moradores que receberam o auxílio são tocantes. Muitos, sob forte abalo emocional, pareciam estar paralisados, sem forças para iniciar a recuperação de suas residências, higienizar pertences que ainda poderiam ser aproveitados e jogar fora bens tornados imprestáveis. O mutirão, intitulado a maior faxina solidária do Rio Grande do Sul, também funcionou como uma injeção de ânimo para o recomeço, após a perda de grande parte de seus patrimônios.
A força-tarefa de limpeza foi mais um exemplo de união de esforços e colaboração entre a sociedade civil e o aparato estatal. A ação foi organizada pela plataforma gaúcha Meu Lar de Volta, que conecta quem precisa de ajuda com que está disposto a arregaçar as mangas e colaborar com pessoas que sequer conhecem. Além da população voluntária, tomaram parte da ação o Instituto Vakinha, a startup Trashin, o Grêmio, as Forças Armadas e o Departamento Municipal de Limpeza Urbana (DMLU). Marinha e Exército, além de veículos para o transporte de materiais, se somaram à tarefa com cerca de 300 militares participantes da Operação Taquari 2. A fabricante de produtos de limpeza Ypê doou 2,5 mil kits com itens para a faxina pesada.
Os voluntários escreveram um capítulo à parte na tragédia climática que se abateu sobre o Rio Grande do Sul. Foram milhares de heróis anônimos, gaúchos e pessoas de outros Estados, movidos apenas pelo impulso de ajudar, deixando de lado afazeres e o conforto de seus lares. Outros, apesar de atingidos pela inundação, não hesitaram em estender a mão aos seus semelhantes antes mesmo de se voltarem para resolver os próprios infortúnios.
Foram arrojados e incansáveis nas ações de resgate e salvamento de pessoas e animais, em cooperação com bombeiros, polícias e Forças Armadas. Depois, no amparo aos 80 mil desabrigados, que tiveram de se alojar em locais organizados às pressas. A mobilização de domingo mostra que, a despeito da fadiga, permanece intacta a disposição de doar tempo e esforço para amenizar a dor de outras pessoas.
De acordo com o Mapa Único do Plano Rio Grande, elaborado pelo Palácio Piratini, foram 283 mil domicílios atingidos pela enchente no Estado. Muitos que tiveram a casa inundada contaram com o auxílio de vizinhos, conhecidos ou de estranhos para terem outra vez seus lares em condições de moradia. A solidariedade será sempre lembrada como uma marca indelével da catástrofe de maio de 2024.