Anunciado nesta quinta-feira como novo ministro da Justiça do governo Lula, o ex-presidente do Supremo Tribunal Federal Ricardo Lewandowski tem pela frente um desafio antigo da pasta, mas que se torna evidente e urgente no momento em que o Equador escancara para o mundo as consequências da leniência do poder público no enfrentamento do crime organizado. A crise de violência sem precedentes no país andino, que inclui motins em prisões, extorsões a comerciantes, sequestros, execuções, depredações e até a inacreditável invasão de bandidos armados a um estúdio de TV, evidencia o poder assumido por organizações criminosas quando o Estado transige com elas e deixa de cumprir o seu papel.
É o que já ocorre há tempos em algumas regiões do país, especialmente em áreas dominadas e administradas por facções criminosas. Ainda na última terça-feira, o prefeito Eduardo Paes, do Rio de Janeiro, procurou a imprensa para denunciar que milicianos e traficantes de drogas estão cobrando propina de servidores da prefeitura e de funcionários de empreiteiras para permitir que eles trabalhem nos canteiros de obras da cidade. Não há exemplo mais contundente da ousadia de delinquentes que se sentem empoderados e impunes.
Nas principais cidades do país, as facções criminosas desempenham protagonismo excessivo e indesejável, muitas vezes devido à transigência das autoridades com sua existência e com suas ações
Não é só no Rio. Nas principais cidades do país, as facções criminosas desempenham protagonismo excessivo e indesejável, muitas vezes devido à transigência das autoridades com sua existência e com suas ações. Basta observar o que ocorre nos grandes presídios do país, que têm alas inteiras dominadas por grupos exclusivos de apenados. Há casos, inclusive, em que os chefes de facções não apenas administram a movimentação da população carcerária como também comandam ações externas de seus cúmplices.
O crime organizado sempre se impõe pelo medo. Ao aterrorizar a população e demonstrar que não temem a repressão policial, os chefões do tráfico e as lideranças das quadrilhas de milicianos geram obediência e submissão dos cidadãos, que em muitos casos se tornam colaboradores da delinquência. Mas o Estado não pode ter medo. Governantes e ocupantes de cargos públicos, especialmente na área da justiça e da segurança, recebem representação dos cidadãos exatamente para protegê-los da criminalidade.
Aí, certamente, está o desafio maior do senhor Ricardo Lewandowski, jurista de inquestionável conhecimento na sua área, mas sem experiência no gerenciamento da segurança pública. Ficará sob sua jurisdição, por exemplo, o comando da Polícia Federal, que atualmente exerce um papel fundamental até mesmo para a preservação das instituições e da própria democracia. É imprescindível, portanto, que o novo ministro constitua uma equipe de assessores com prática e conhecimento suficientes para compensar sua inexperiência no combate à criminalidade. E também que se espelhe no que está ocorrendo atualmente no Equador para tirar as devidas lições e agir preventivamente, dando apoio aos administradores públicos brasileiros que têm dificuldade para controlar a segurança pública em suas respectivas unidades federativas.