Ely José de Mattos, economista e professor da Escola de Negócios da PUCRS
Esta semana a prefeitura concluiu o leilão da Carris. A empresa Viamão arrematou a companhia de ônibus por pouco mais do que o lance mínimo e ainda poderá exercer a opção de quitar mais de 60% do valor devolvendo terrenos que estão no pacote. Mas valor e sistema de pagamento sequer se configuram como pontos centrais na venda. O Executivo sempre argumentou que estaria propondo a privatização da empresa em função dos seus custos de operação e da convicção de que o poder público municipal não teria a função de manter uma empresa de transporte, ainda mais tendo um balanço contábil problemático.
Neste contexto, a prefeitura avalia que com gestão privada poderia haver melhoria do serviço da empresa, que não era algo ao alcance dos cofres municipais. Mais do que isso, a prefeitura, ao divulgar a concretização da venda no seu site, reproduziu uma fala do prefeito Sebastião Melo que destaca que a venda da Carris “... faz parte de um projeto maior de qualificação e modernização do transporte coletivo...”.
Parece-me claro que a alienação da Carris é uma medida saneadora das contas do município e um afastamento deliberado da prefeitura da operação do transporte coletivo
Parece-me claro que a alienação da Carris é uma medida saneadora das contas do município e um afastamento deliberado da prefeitura da operação do transporte coletivo. O que não me é claro, no entanto, é a relação deste movimento com a melhoria do transporte coletivo na cidade. De um lado, o dinheiro que a prefeitura deixará de repassar para a Carris não é algo que revolucionará o cenário da mobilidade urbana – até porque terá destinações potenciais em diversas outras áreas.
De outro lado, nada muda no sistema de oferta do transporte público de Porto Alegre. A única diferença é a substituição de uma empresa pública por uma empresa privada. E aqui vale mencionar que a prefeitura está, inclusive, abrindo mão de ser força moduladora do mercado ao buscar estabelecer padrão de qualidade através da sua empresa – coisa que aconteceu por muitos anos com a Carris.
Portanto, privatizar a Carris pode ter papel saneador das contas do município. Pode também, ainda que não seja uma certeza, contribuir para segurar um pouco o valor da passagem e, ainda, ter alguns ônibus adicionais com ar-condicionado. Mas não é possível afirmar que seja uma medida que, isolada, represente melhoria do sistema de mobilidade. Não está claro o mencionado “projeto maior de qualificação”. Esperaria que envolvesse, por exemplo, repensar a cidade para que o transporte coletivo seja prioridade sobre o automóvel. Será?