Os benefícios da reforma tributária aprovada por ampla maioria na noite de quinta-feira na Câmara dos Deputados foram exaustivamente apresentados à medida que a votação se aproximava e o tema era mais debatido pela sociedade. Ganha o Brasil pela simplificação do emaranhado de impostos, pelo fim das incidências em cascata, pela redução de custos para as empresas, pela segurança jurídica, pela maior competitividade e pelo potencial de o PIB crescer mais nos próximos anos. Foram décadas de tentativas frustradas até a chancela dos deputados federais. Agora, o texto será analisado pelo Senado, onde pode ser aprimorado.
Houve significativo esforço para demonstrar que a pauta da reforma tributária não era de governo, mas de Estado
Mas há outro aspecto que merece ser louvado, por indicar um amadurecimento do país. Diferentes correntes políticas foram capazes de deixar suas diferenças de lado, negociar e buscar consensos, até se chegar à aprovação histórica. Os méritos são divididos entre atores dos mais diversos campos. O texto teve bases técnicas, assentadas por nomes como o do secretário extraordinário da Reforma Tributária do Ministério da Fazenda, Bernard Appy, um dos maiores conhecedores do tema. Teve o apoio político do titular da pasta, Fernando Haddad, o engajamento pessoal do presidente da Câmara, Arthur Lira, a disposição incansável para dialogar do relator, Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), e uma adesão decisiva do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, dando fim aos antecedentes de resistência do Executivo paulista à reformulação do sistema de impostos. Tem grande simbolismo a imagem de Haddad e Tarcísio, adversários eleitorais há poucos meses, lado a lado defendendo a reforma.
O texto aprovado na Câmara não é o dos sonhos. Foi o possível diante da complexidade das negociações e múltiplas preocupações regionais e setoriais que precisou acomodar. Mas deve ser celebrado, porque ao cabo prevaleceu o interesse do país. Segmentos da economia, governadores como o gaúcho Eduardo Leite e o mineiro Romeu Zema, prefeitos e especialistas levaram as suas inquietações e sugestões. Ao fim, chegou-se a um desfecho que alinha o Brasil às práticas das nações mais desenvolvidas.
É o resultado da boa política e da democracia, regime em que homens e mulheres de diferentes visões aceitam conversar em busca do melhor para a coletividade. Houve, especialmente nas últimas semanas, significativo esforço para demonstrar que a pauta da reforma tributária não era de governo, mas de Estado. Não se subestima que a liberação de emendas colaborou. O fisiologismo, infelizmente, é método corriqueiro no país. Mas o desenlace mostra sobretudo que é possível debater e costurar convergências em temas nacionais, a despeito da disputa eleitoral saudável. A pacificação que o Brasil clama depende, especialmente, desse desprendimento de saber que, em momentos decisivos, é preciso transigir e ter postura de estadista.
Os votos contrários à reforma vieram especialmente dos deputados ligados ao ex-presidente Jair Bolsonaro. Em certa medida, é um comportamento equivalente a erros históricos do PT, como ter votado contra a Constituição de 1988 e ter sido oposição ao Plano Real. O caminho para um país próspero ainda é longo. Passa pela disposição ao diálogo em torno de matérias estruturantes e que beneficiem a ampla maioria da sociedade. Haverá esperanças mais palpáveis se o consenso formado para votar a reforma tributária for o sinal de que o Brasil avança rumo ao amadurecimento político.