São desconcertantes os números levantados pela Confederação Nacional dos Municípios (CNM) sobre a quantidade de obras de escolas, creches e outras estruturas ligadas à educação que se encontram paralisadas ou inacabadas. Os dados compilados incluem convênios firmados de 2007 a 2022 entre prefeituras e o governo federal, por meio do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE). São cerca de 3,1 mil construções inconclusas em 1,5 mil municípios. No Rio Grande do Sul, foram verificadas cem obras, espalhadas por 65 cidades.
Resolver esse problema é uma questão de respeito ao dinheiro público e de colocar em prática o discurso de que o ensino é uma prioridade
O período abrangido mostra que não é uma dificuldade de um governo específico. Perpassa diferentes gestões. É uma incapacidade crônica do Estado brasileiro. Há também dificuldades das próprias administrações municipais, especialmente nos municípios menores, onde não há estrutura ou preparo adequado para lidar com a burocracia, o conhecimento sobre normas é considerado insuficiente e, por isso, há maior dificuldade para cumprir corretamente as exigências dos convênios, o que muitas vezes se traduz na interrupção do fluxo de transferência de recursos.
Em todo o país, em relação às 3,1 mil obras paralisadas ou inacabadas, o total que deveria ser repassado pela União seria de R$ 3,1 bilhões, mas a transferência de R$ 1,8 bilhão, mais da metade, não ocorreu. No Estado, o pactuado foi um montante de R$ 116,4 milhões, mas não chegaram R$ 71,8 milhões às prefeituras. Obra paralisada é a que ainda tem o termo de compromisso vigente, mas foi interrompida por algum motivo. Pode, no entanto, ser retomada, com as inconformidades resolvidas. Nas inacabadas, o termo para o repasse do recurso expirou e, nesse caso, há necessidade de repactuação entre o município e o FNDE. Existem, portanto, diferentes situações, com soluções distintas.
Não é possível aceitar essa situação, como se fosse uma fatalidade brasileira. Obras paradas, seja qual for a razão, já consumiram recursos públicos – pagos pela sociedade, que espera um retorno dos impostos recolhidos. Mesmo retomadas, tendem a ter um custo superior ao estimado originalmente. Mas simplesmente abandoná-las seria um atestado de incompetência e de improbidade. A CNM diz estar aconselhando prefeitos a concluí-las, mesmo com recursos próprios, se possível, para evitar mais transtornos e complicações. Os municípios já têm feito isso, demonstra a entidade. Afinal, a necessidade existe. As deficiências de infraestrutura escolar no Brasil são conhecidas, o que vale também para o Rio Grande do Sul. Há demanda reprimida. Um levantamento da Associação dos Membros dos Tribunais de Contas do Brasil (Atricon) indica que, no Brasil, faltam 3,3 milhões de vagas em creches e na pré-escola, sendo 134 mil apenas no Estado.
Se esforçar para resolver esse problema é uma questão de respeito ao dinheiro público e de colocar em prática o discurso de que o ensino é uma prioridade. Já passou da hora de compreender melhor as razões que levam à interrupção de obras com essas características para adotar ações mitigadoras. O governo federal tem alardeado a criação da plataforma Mãos à Obra para realizar diagnósticos da situação de projetos com recursos da União que estejam parados Brasil afora. A intenção seria definir obras prioritárias para retomá-las. Os gestores municipais foram instados a prestar essas informações por meio do novo instrumento e elencar o que consideram o mais urgente. É uma boa oportunidade para testar a eficácia da ferramenta.