Geram certa preocupação os recentes movimentos do Palácio do Planalto de acelerar nomeações em cargos de segundo escalão de indicados por partidos que não têm uma postura firme de apoio ao governo. Essa inquietação não está ligada a uma posição de criminalização da política ou de ignorar a dura realidade de que, no país, a governabilidade tem sido garantida por diferentes presidentes por meio do toma lá dá cá.
Diante desse cenário de fisiologismo persistente, órgãos de controle devem redobrar a atenção
O alerta se deve à constatação de dificuldade do governo Luiz Inácio Lula da Silva de construir uma base sólida no Congresso e ao risco de esse loteamento abrir margem para novos episódios de mau uso do dinheiro público. Um exemplo eloquente desse temor reside na decisão de manter apaniguados do centrão na Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba ( Codevasf), estatal epicentro de denúncias de irregularidades envolvendo verbas do orçamento secreto.
O governo age com o velho pragmatismo diante da constatação de uma sustentação frágil. A ficha parece ter caído definitivamente após o aviso do presidente da Câmara, Arthur Lira, de que o Planalto teria sérias dificuldades em votações no parlamento. Mesmo as que necessitassem de maioria simples. A advertência de Lira, obviamente, também não foi desinteressada. Afinal, o deputado alagoano é um hábil gestor dos interesses de um grande número de colegas integrantes de um parlamento já empoderado.
Mas o fato é que o governo corre risco de derrotas no Congresso e encontra dificuldades na busca pela retirada de assinaturas do pedido de instalação da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) proposta para apurar os atos violento do 8 de janeiro. Ao mesmo tempo, há várias medidas provisórias (MPs) paradas devido a uma disputa entre Lira e o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, sem até agora o Planalto conseguir encontrar uma saída para que sejam votadas.
Ainda na semana passada, o presidente Lula decidiu manter na pasta das Comunicações o ministro Juscelino Filho, mesmo com uma série de indícios de irregularidades que o envolviam. O episódio deu a impressão de que, devido à debilidade da coalização governista, o presidente preferiu ser condescendente. É um precedente perigoso. Não criminalizar a política não quer dizer fechar os olhos para desvios de conduta. Diante desse cenário de patrimonialismo enraizado e fisiologismo persistente, órgãos de controle do Executivo, como a Controladoria-Geral da União (CGU), além do Tribunal de Contas da União (TCU), devem redobrar a atenção para inibir e detectar situações suspeitas.
O apetite dos partidos do centrão por cargos e emendas está longe de ser novidade. Não se deve ser ingênuo ao ponto de imaginar que seus integrantes votarão com o Planalto ou assegurarão uma governabilidade mínima sem barganhar alguma vantagem em troca. Mas há limites, e não são apenas aqueles que separam o jogo político aceitável da corrupção. Há projetos que são de interesse do país, como as pautas da reforma tributária e do novo marco fiscal.