O orçamento da União para 2022, sancionado na segunda-feira pelo presidente Jair Bolsonaro, é um melancólico retrato do momento político atravessado pelo país. Verdadeiras prioridades como investimentos, aportes para ciência e tecnologia, educação e ações sociais foram sacrificadas em nome da preservação de polpudos recursos para emendas, campanhas eleitorais e aumento de salário para categorias específicas. Ao fim, o corte de R$ 3,1 bilhões determinado pelos vetos do Planalto sequer arranhou os interesses dos aliados do governo no Congresso e o volume recorde de R$ 4,9 bilhões de dinheiro público que será destinado ao fundo partidário para ser usado na campanha eleitoral.
Entre o futuro e outubro, optou-se pelo segundo, norteado apenas pela busca da sobrevivência política
As escolhas contidas no orçamento ilustram a realidade de Brasília: um Executivo débil que precisa abrir os cofres para o centrão em troca de uma tênue governabilidade. E um Congresso cada vez mais ávido por recursos que possa distribuir com objetivos eleitoreiros, deixando em segundo plano, se seus próprios interesses estiverem em jogo, as reais necessidades da população e programas de médio e longo prazo que possam contribuir para o desenvolvimento sustentado do país.
O orçamento reserva somente R$ 42,3 bilhões para investimentos. É apenas um quinto do valor destinado para esse fim 10 anos atrás. Trata-se do menor montante da história, o que certamente diminui o potencial de crescimento da economia em 2022. Note-se ainda que 40% desse volume será controlado por deputados federais e senadores e possivelmente será dirigido para obras paroquiais. Entre o futuro e outubro, optou-se pelo segundo, norteado apenas pela busca da sobrevivência política.
Os cortes, por outro lado, atingem o Ministério da Educação, notadamente o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), que transfere recursos essenciais para o ensino aos entes subnacionais. São cerca de R$ 500 milhões que farão muita falta em um momento em que o país tem de dar atenção especial à recuperação do déficit de aprendizagem causado pela pandemia. O INSS teve a maior tesourada, de quase R$ 1 bilhão. Recursos já insuficientes para o combate a queimadas florestais, um problema cada vez mais recorrente em biomas como Amazônia e Pantanal, tampouco foram poupados. Sequer a Fiocruz, de comprovada importância no combate à crise sanitária, grande urgência nacional, passou incólume pela supressão de verbas. Mas, como dito antes, os parlamentares não têm do que se queixar: garantiram R$ 35,6 bilhões para partilhar, quase metade para as chamadas emendas secretas, que ainda carecem da devida transparência.
Mesmo que possa parecer ingenuidade, ainda se espera que, quando o Congresso analisar os vetos presidenciais, corrija algumas distorções. Eventuais revisões, entretanto, serão insuficientes para desfazer a afronta à população. O orçamento, formado por recursos obtidos junto aos contribuintes, tem de ser orientado de acordo com o interesse público, e não conforme a conveniência de pequenos mas influentes grupos. Pelo jeito, é mais uma tarefa que fica pendente para o país.