A substituição da frota de veículos movidos a combustíveis fósseis por modelos elétricos é uma tendência irrefreável no mundo. Grandes montadoras, por exemplo, têm a decisão tomada de encerrar a produção de automóveis a gasolina e a diesel até a virada da década. Algumas das principais cidades do mundo e a União Europeia, ao mesmo tempo, estão adotando medidas para eliminar a venda e restringir a circulação de carros que hoje seriam convencionais. Estados norte-americanos têm iniciativas no mesmo sentido. O movimento se insere no esforço global pela descarbonização, em um contexto de tentativa de conter as mudanças climáticas causadas pelo aumento da temperatura do planeta.
País precisa deixar o histórico de improvisos de lado e se preparar de maneira consistente para esta nova era
O Brasil, ainda de maneira mais tímida e atrasada, tenta acelerar o passo neste processo de transição que mira a sustentabilidade. O número de veículos elétricos nas ruas e estradas nacionais é diminuto, mas cresceu em uma boa proporção no ano passado, mostrou reportagem publicada na edição de ontem de Zero Hora. Os emplacamentos subiram 77% em relação a 2020. No Rio Grande do Sul, o avanço foi ainda mais expressivo, da ordem de 82%.
Para que esta evolução também se consolide no país e no Estado, existe uma série de desafios à frente a serem vencidos. Alguns são mais complexos. O primeiro deles é o preço dos modelos, muito acima dos veículos a diesel e gasolina. São, portanto, ainda inacessíveis para a esmagadora maioria da população. Este problema, no entanto, tende a ser minorado com o paulatino aumento das escalas de produção nas fábricas, inclusive das baterias. Mas não será algo rápido. Outro óbice relevante, neste momento, é a infraestrutura para recarga dos veículos. Mas espera-se que esta dificuldade seja contornada pelo mercado, de acordo com a percepção do aumento da demanda, com o crescimento natural da frota.
Um dos grandes pontos de interrogação no Brasil parece ser a oferta de energia para suportar, a custos razoáveis, a procura futura. O país atravessou, recentemente, período de incerteza em relação a possíveis apagões devido ao baixo nível das hidrelétricas, responsáveis por cerca de dois terços da matriz nacional. Mesmo assim, a situação só não ficou ainda mais grave devido ao ritmo lento da economia. Hoje recorre-se a termelétricas. São mais caras, o que é percebido a cada mês pelos consumidores.
Mas parece fazer pouco sentido apostar neste tipo de usina, especialmente movidas a diesel. Seria elevada a emissão de gases causadores do efeito estufa em um dos elos da cadeia energética para cortar em outra. Viabilizar a eletrificação do setor de transportes no país, portanto, também depende de um planejamento de longo prazo que garanta a abundância de energia limpa e renovável, com a ampliação de parques eólicos e a geração solar. Estas, entretanto, são fontes intermitentes. Autoridades da área terão de mensurar se serão suficientes ou se também será necessário lançar mão de mais termelétricas a gás natural, menos poluidoras em comparação ao óleo ou o carvão, mas garantidoras de oferta firme. Se os veículos elétricos são uma tendência irreversível, o país precisa deixar o histórico de improvisos de lado e se preparar de maneira consistente para não enfrentar sobressaltos em sua transição para esta nova era.