Por Ely José de Mattos, economista e professor da Escola de Negócios da PUCRS
Já sabemos que não basta apenas crescer para que tudo melhore na estrutura socioeconômica. Para que crescimento econômico se reverta em melhoria de qualidade de vida para a população como um todo, uma série de condições precisa se fazer presente. Em uma economia com alto desemprego como a brasileira, um dos elementos necessários para que crescimento beneficie o maior número de pessoas possível é justamente que ele crie emprego. E o que estamos vendo neste início de retomada não aponta nessa direção.
Existe um aparente paradoxo nos dados atuais: crescimento do PIB, mas sem gerar empregos. Como é possível gerar mais riqueza sem empregar mais? Uma resposta sedutora seria a da simplicidade matemática: as pessoas que se mantêm empregadas estão produzindo mais do que antes. Mas essa conclusão é precipitada e quero explorar duas questões sobre isso.
Portanto, ainda que estejamos observando crescimento econômico, ele ainda está longe da casa da maior parte dos brasileiros
Primeiro, a retomada que estamos vendo está sendo puxada por setores que sofreram menos com a pandemia e que também empregam menos gente, como é o caso do comércio eletrônico, químicos, mineração, agropecuária. Para vários deles, aliás, a situação de pandemia significou um impulso. De outro lado, o setor de serviços, que emprega cerca de um terço dos trabalhadores brasileiros, ainda passa por dificuldades e não podemos considerar que está em recuperação plena. Portanto, a riqueza representada pelo PIB está sendo gerada em setores que empregam menos.
Segundo, a produtividade total do trabalho no Brasil não parece ter aumentado, conforme aponta um recente estudo do Ipea, publicado na sua Carta de Conjuntura número 51. De acordo com o relatório, em períodos de crise, a participação do grupo de trabalhadores mais qualificados aumenta em relação aos trabalhadores com menos qualificação – que são os primeiros a serem desligados –, gerando uma melhora relativa na qualidade da força de trabalho ocupada. Assim, a queda na quantidade de horas totais trabalhadas na economia é compensada pela melhoria na qualidade relativa da mão de obra. E, quando se leva essa particularidade em consideração, se verifica que não houve aumento na produtividade total, mas apenas uma reorganização da força de trabalho.
Portanto, ainda que estejamos observando crescimento econômico, ele ainda está longe da casa da maior parte dos brasileiros. O desafio do país, daqui para a frente, será crescer de forma inclusiva. Caso contrário, pobreza e desigualdade seguirão se ampliando.