Por Ely José de Mattos, economista e professor da Escola de Negócios da PUCRS
Conceitualmente, entendemos a desigualdade como a diferença entre pessoas, ou grupos, em relação à determinadas características. No caso do rendimento, a desigualdade é compreendida como a diferença entre os salários, claro. A questão é entender as razões desta diferença. A desigualdade de renda é muito mais um sintoma do que o problema em si. Precisamos entender os determinantes da disparidade para sermos capazes de compreender a dimensão do problema.
Pense em dois irmãos gêmeos. Suponha que eles tenham morado com os pais até os 25 anos e feito exatamente o mesmo curso de graduação, na mesma instituição, com desempenho semelhante. Suponha, ainda, que conseguissem empregos no mesmo setor, em empresas de mesmo porte. Neste caso, seria de se esperar que eles auferissem rendimentos muito semelhantes. Seriam exemplos perfeitos de igualitarismo. Ainda assim, guardariam pequenas diferenças de renda em função de características pessoais, que independem de tudo aquilo que compartilharam ao longo da vida – como a escolha por um departamento específico na companhia ou o tanto de horas extras que cada um deseja fazer.
A desigualdade que temos hoje precisa ser enfrentada de imediato, através de políticas específicas que promovam algum reequilíbrio na redistribuição de renda
Acontece que, volta e meia, surge o argumento de que a desigualdade não seria um grande problema, por si só. Como se fôssemos todos como aqueles gêmeos, as disparidades de rendimento seriam, em grande medida, frutos destas diferenças pessoais ou de escolhas. Eis que nasce, então, a equivocada ideia de que “o problema é a pobreza e não a desigualdade”.
A pobreza é, sim, um problema. Representa a condição mais severa de privação de condições básicas de vida e de liberdade de escolhas para viver uma vida plena. A desigualdade, no entanto, é resultado justamente de uma série de privações que as pessoas enfrentaram ao longo da vida que, em boa medida, condicionaram suas escolhas de modo definitivo. O ambiente familiar, alimentação, educação, segurança: tudo isso são elementos que ajudam a moldar o quanto os indivíduos se tornam livres para fazer usas escolhas e evoluir.
A desigualdade que temos hoje precisa ser enfrentada de imediato, através de políticas específicas que promovam algum reequilíbrio na redistribuição de renda. E isso é necessário para que as novas gerações possam construir um futuro mais igualitário a partir das suas origens. Caso não façamos isso, estaremos condenados a contar a mesma história repetidamente ao longo das décadas.