Fará bem o presidente Jair Bolsonaro se, logo após o Carnaval, acabar com as hesitações e finalmente enviar a proposta de reforma administrativa do governo para o Congresso. Desde outubro do ano passado o Planalto mostra-se titubeante e vem adiando a remessa do texto. Primeiro, foi o alegado temor de um contágio dos protestos do Chile, algo que sequer chegou perto de acontecer no Brasil. Depois, a justificativa foi suposta piora do clima para a aprovação após o ministro Paulo Guedes ter comparado funcionários públicos a parasitas. O fato é que, nas duas oportunidades, a vacilação abriu margem para aumentar as desconfianças em relação ao entusiasmo do presidente com as medidas, essenciais para melhorar a produtividade da máquina estatal brasileira e começar a eliminar privilégios insustentáveis.
São mudanças essenciais para melhorar a produtividade da máquina estatal brasileira e começar a eliminar privilégios insustentáveis
Menos mal que, noticia-se, Bolsonaro foi convencido pela equipe econômica de que a protelação emite sinais ruins para quem até agora manteve-se esperançoso com a melhora da economia brasileira. A postura poderia ser interpretada como perda de ímpeto reformista por quem tem a palavra final no governo, com argumentos eleitorais pesando mais na decisão do que a indispensável correção das distorções que tornam o setor público pesado e ineficiente, com prejuízos aos serviços prestados aos cidadãos.
As despesas com pessoal são a segunda maior despesa da União, superadas apenas pela Previdência. É urgente que sejam instituídas novas regras para aproximar os salários do funcionalismo aos praticados pela iniciativa privada, baixando os vencimentos iniciais. É preciso ainda reduzir drasticamente o número de carreiras, criar critérios mais justos para promoções que não apenas o temporal e, ao mesmo tempo, aperfeiçoar mecanismos que facilitem o desligamento de funcionários com baixo desempenho. As novas regras devem valer apenas para quem vier a ingressar no serviço público, o que tende a diminuir a oposição das corporações.
Um minucioso estudo do Banco Mundial publicado em outubro do ano passado mostrou que, no Brasil, os servidores da União ganham, em média, 96% acima de um trabalhador com a mesma qualificação e função em uma empresa privada. Há no Brasil uma ascensão muito rápida para o topo da carreira. Ser promovido apenas por tempo de serviço é ainda um convite à acomodação. Premia-se de forma igual quem se esforça e quem prefere a zona de conforto. Pregar a necessidade de uma reforma administrativa não significa depreciar o funcionário público. A mudança de regras, ao contrário, será benéfica para os servidores qualificados e zelosos de suas funções, que terão a oportunidade de galgar posições por mérito. Um incentivo à produtividade, portanto.
Após o envio do texto da reforma administrativa, é preciso que o presidente mostre verdadeiro empenho para aprová-lo. Será uma sinalização positiva, indicando que o governo busca racionalizar seus gastos, enquanto abre, no futuro, maior espaço fiscal para investir em infraestrutura e melhorar os serviços para a população. É uma lição de casa que tem o poder de contagiar positivamente agentes da economia como empresários e consumidores, aumentando o potencial de crescimento da atividade por fatores internos, algo que se torna ainda mais crucial em um período de desaceleração do PIB global, um movimento agravado pelo surto de coronavírus que começa a se espalhar de forma mais rápida fora da China